Revista da EMERJ - V. 20 - N. 2 - Maio/Agosto - 2018
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 2, p. 291-311, Maio/Agosto. 2018 294 do direito. Tal conceito estava de acordo, inclusive, com a geração de direitos fundamentais então vigente, qual seja, a primeira geração, enquanto direito de abstenção, intimamente ligado à liberdade. Agora, já em 1960, diante do avanço das tecnologias da chama- da sociedade da informação, percebeu-se que não era mais possível definir a privacidade apenas como o “direito de ser deixado só”. Nesse momento, surge um forte clamor social para que o Estado garanta mi- nimamente a efetividade da proteção da privacidade com a finalidade da busca pelo livre desenvolvimento da personalidade humana 7 . No contexto de tal movimento, nos Estados Unidos, o direito à privacidade foi reconhecido pela Suprema Corte no caso Griswold v. Connecticut (1965). No caso em tela, a Suprema Corte reconheceu a inconstituciona- lidade de uma lei do estado de Connecticut que proibia o uso de me- dicamentos contraceptivos, sob o fundamento de que essa lei ofendia o direito à privacidade do casal 8 . Com isso, passou-se a conferir status constitucional à privacidade, justamente aquilo que Warren e Brandeis buscaram em 1890 ao escreverem o supracitado artigo. Conceitualmente, nos dias de hoje, pode-se dizer que a privacidade é o direito de manter o controle sobre suas próprias informações e de determinar a maneira de construir sua própria esfera particular 9 . Trata-se de direito que se projeta além do mero direito ao recato, como se susten- tava em fins do século XIX, tendo outras projeções, ligadas diretamente à proteção de uma esfera de inviolabilidade do próprio indivíduo, em face do Estado e de terceiros, intimamente ligado à formação de sua personalidade. 7 BAIÃO, Kelly C. Sampaio; GONÇALVES, Kalline Carvalho. A garantia da privacidade na sociedade tecnológica: um imperativo à concretização do princípio da dignidade da pessoa humana. Civilistica.com. Rio de Janeiro. Ano 3, nº 2, (jul. - dez. 2014). [Con. 25 abril 2018]. Disponível em: http://civilistica.com/agarantia-da-privacidade-na-sociedade-tecnologica-um-imperativo-a- concretizacao-do-principio-dadignidade-da-pessoa-humana/>. 8 Como destacado na decisão proferida pela Suprema Corte: ”entire fabric of the Constitution and the purposes that clearly underlie its specific guarantees demonstrate that the rights to marital privacy and to marry and raise a family are of similar order and magnitude as the fundamental rights specifically protected. Although the Constitution does not speak in so many words of the right of privacy in marriage, I cannot believe that it offers these fundamental rights no protection.” ( U.S. Supreme Court , Griswold v. Connecticut, 381 U.S. 479 (1965) Griswold v. Connecticut, No. 496, Argued March 29- 30, 1965, Decided June 7, 1965) . Tradução livre do autor: Todo o tecido da Constituição e os propósitos que claramente fundamentam suas garantias específicas demonstram que os direitos à privacidade conjugal e ao casamento e ao sustento de uma família são de ordem e magnitude semelhantes aos direitos fundamentais especificamente protegidos. Embora a Constituição não fale em tantas palavras do direito à privacidade no casamento, não posso acreditar que ela ofereça a esses direitos fundamentais nenhuma proteção.” 9 RODOTÁ, Stefano. A vida na sociedade da vigilância - A privacidade hoje. Op. cit., p. 15.
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