Revista da EMERJ - V. 20 - N. 2 - Maio/Agosto - 2018

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 2, p. 261-276, Maio/Agosto. 2018  270 Se, por acaso, pediam algo (pedir em latim era rogare ), os pobres eram tolerados, desde que se expressassem com humildade. Se, porém, ousavam reivindicar algo (em la- tim, reivindicar era arrogare ), passavam a ser vistos como arrogantes. (KONDER: 2004, p. 154-155) Em seguida, no mesmo capítulo, Konder analisa as visões de Walter Benjamin, Jürgen Habermas e Mikhail Bakhtin sobre a lingua- gem, seu dinamismo, seu caráter ideológico explicitado pelas ações concretas que a consubstanciam. Selecionamos alguns trechos em que Konder se detém sobre a visão de Bakhtin, por ser a que mais de perto alia ideologia, dinamicidade discursiva, instâncias de poder, simbologia e memória: Para o crítico russo [Mikhail Bakhtin], a linguagem estava sempre sendo criada, tinha uma existência dinâmica, trans- formava-se continuamente, e o povo – a multidão dos fa- lantes – desempenhava um papel absolutamente essencial nesse processo de criação permanente. [...] Bakhtin resgatou elementos plebeus que costuma- vam ser sistematicamente desqualificados pelos analistas que estudavam a cultura popular. E os resgatou também no âmbito da linguagem. Os palavrões, por exemplo, são reconhecidos e apreciados por ele como contribuições “à criação de uma atmosfera de liberdade”. Enquanto intelec- tuais tão importantes como Voltaire, La Bruyère e George Sand manifestavam repulsa ante o que lhes parecia gros- seiro e vulgar na obra de Rabelais, Bakhtin sublinhou nos escritos do autor de Gargantua e Pantagruel o vigor da sau- dável transgressão, a quebra positiva de tabus linguísticos e o fecundo aproveitamento da riqueza e da heterogeneidade do vocabulário da “praça pública”. Em sua reavaliação das extraordinárias potencialidades da cultura popular, Bakhtin promoveu, igualmente, significativa revalorização do riso, da comicidade. [...] (KONDER: 2004, p. 158-159) São exemplos simples, mas que mostram que a palavra, além de seu estrato material (o significante, fônico/oral ou escrito), é dota-

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