Revista da EMERJ - V. 20 - N. 2 - Maio/Agosto - 2018
205 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 2, p. 202-243, Maio/Agosto. 2018 de abandono de posto, descumprimento de missão e deserção); de outro giro, quando a conduta também encontrasse incriminação em outros di- plomas legais (como no caso do roubo, estupro ou corrupção), teríamos a categoria dos crimes militares impróprios. Essa dicotomia espelhada em um “universo particular” (entendido como a previsão de crimes militares apenas no Código Penal Militar) con- duzia a uma decantada defasagem dos delitos militares, quando compara- dos à legislação criminal comum. 3 E, sob o argumento da necessidade de atualização da legislação penal castrense, o Parlamento brasileiro usou expediente de baixa técnica legislativa: ao invés de proceder à revisão detalhada de toda e legislação criminal comum e extravagante, ponderando sua pertinência com a tutela penal de interesses militares (e a necessária calibragem e equalização de penas para condutas previstas em diplomas distintos), o legislador da reforma limitou-se a acrescentar disposição até então inédita na justiça de caserna: passou a considerar crimes militares, em tempo de paz, “os crimes previstos neste Código e os previstos na legislação penal”, quando praticados na forma dos incisos do art. 9º, inciso II. 2. A LEI 13.491/17 E O NOVO E CONCENTRADO CONCEITO DE CRIME MILITAR: A ATUALIZAÇÃO DE TODA A LEGISLAÇÃO PE- NAL MILITAR PELA ALTERAÇÃO DE UM ÚNICO DISPOSITIVO (ART. 9 o , II) O art. 9º do CPM passa, agora, pela sua terceira alteração legislativa desde 1969. Desde sua origem, busca disciplinar o conceito de crime mili- tar, em suas variadas situações, bem como, por via de consequência, fixar a competência da Justiça Militar. Como visto, o critério inicialmente utilizado seguia uma lógica simples: em regra, considerávamos crimes militares aquelas condutas pre- vistas exclusivamente no Código Penal Militar ou por ele regulamentado/ redigido de forma diferente e própria ( crimes militares próprios ) e aqueles que, embora previstos também no Código Penal Militar, contavam com igual definição na lei penal comum ( crimes militares impróprios ). 3 Apenas a título de ilustração, a Lei 12.015/2009 alterou o Título VI do Código Penal comum, introduzindo o conceito de crimes contra a dignidade sexual , revisando condutas e penas dos crimes previstos nos arts. 213 e seguintes. No entanto, o legislador simplesmente ignorou a existência de condutas atentatórias à liberdade sexual no âmbito castrense, deixando de promover a revisão do Capítulo VI, do Título IV, do CPM, acarretando uma injustificada disparidade de tipificações e de penas abstratamente previstas, para condutas ontologicamente idênticas.
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