Revista da EMERJ - V. 20 - N. 2 - Maio/Agosto - 2018
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 2, p.147-173, Maio/Agosto. 2018 149 tamente a quem cabe o ônus de provar determinadas alegações de fato. Fala-se aí em ônus subjetivo ou função subjetiva das regras do ônus da prova, que permite “dar conhecimento a cada parte de sua parcela de res- ponsabilidade na formação do material probatório destinado à construção do juízo de fato” 4 . “O desejo de obter a vitória cria para a litigante a neces- sidade, antes de mais nada, de pesar os meios de que se poderá valer no trabalho de persuasão, e de esforçar-se, depois, para que tais meios sejam efetivamente utilizados na instrução da causa. Fala-se, ao propósito, de ônus da prova, num primeiro sentido ( ônus subjetivo ou formal )” 5 . Sucede que é possível que as provas produzidas sejam insuficientes para revelar a verdade dos fatos. Mesmo sem prova, porém, impõe-se ao juiz o dever de julgar – afinal, é vedado o non liquet . A partir daqui, entra a segunda perspectiva pela qual se podem en- xergar as regras sobre ônus da prova: trata-se de regramento dirigido ao juiz (uma regra de julgamento ), que indica qual das partes deverá suportar as consequências negativas eventualmente advindas da ausência, ao final da atividade instrutória, de um determinado elemento de prova. Sob esse ângulo, fala-se em ônus objetivo 6-7 . Em síntese, as regras processuais que disciplinam a distribuição do ônus da prova tanto são regras dirigidas às partes, na medida em que as orientam sobre o que precisam provar ( ônus subjetivo ), como tam- 4 CARPES, Artur. Ônus dinâmico da prova. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010, p. 52. 5 MOREIRA, José Carlos Barbosa. “Julgamento e ônus da Prova”. Temas de Direito Processual Civil – segunda série. São Paulo: Saraiva, 1988, p. 74-75. 6 “A circunstância de que, ainda assim, o litígio deva ser decidido torna imperioso que alguma das partes suporte o risco inerente ao mau êxito da prova. Cuida então a lei, em geral, de proceder a uma distribuição de riscos: traça critérios desti- nados a indicar, conforme o caso, qual dos litigantes terá de suportá-los, arcando com as conseqüências desfavoráveis de não se haver provado o fato que lhe aproveitava. Aqui também se alude ao ônus da prova, mas num segundo sentido (ônus objetivo ou material)”. (MOREIRA, José Carlos Barbosa. “Julgamento e ônus da Prova”. Temas de Direito Processual Civil – segunda série. São Paulo: Saraiva, 1988, p. 74-75). “O valor normativo das disposições pertinentes à distribuição do onus probandi assume real importância na ausência de prova: em semelhante hipótese é que o juiz há de indagar a qual dos litigantes competia o ônus, para imputar-lhe as consequências desfavoráveis da lacuna existente no material probatório”. (MOREIRA, José Carlos Barbosa. “As Presunções e a Prova”. Temas de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva, 1977, p. 61). 7 Flávio Luiz Yarshell, a despeito de utilizar essa terminologia, critica a qualificação do ônus da prova em subjetivo e ob- jetivo. Em sua opinião, “sob o prisma puramente lógico, desvincular essa posição jurídica dos sujeitos parciais importaria descaracterizá-la como um autêntico ônus, que a toda evidência não pode ser de titularidade do juiz (que, no processo, exerce essencialmente poderes e se sujeita a deveres)” (YARSHELL, Flávio Luiz. Antecipação da prova sem o requisito da urgência e direito autônomo à prova. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 65). Sucede que, em nosso entendimento, as qua- lificações subjetivo e objetivo não têm por escopo determinar se o ônus é atribuído, respectivamente, às partes ou ao juiz. Falar em ônus sob uma perspectiva objetiva não implica atribuí-lo ao juiz. O juiz, naturalmente, não tem ônus de provar nada. O ônus de provar, nos moldes descritos pelo legislador, é das partes. O que se quer dizer é que as mesmas regras que disciplinam a distribuição do ônus (que as partes têm) de provar devem servir de parâmetro objetivo para que o juiz, ao decidir, possa imputar as consequências negativas de eventual ausência de prova de uma alegação de fato à parte que, desde o princípio, tinha o encargo de prová-la.
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