Direito em Movimento - Volume 20 - Número 2 - 2º semestre - 2022
189 ARTIGOS Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 20 - n. 2, p. 178-195, 2º sem. 2022 Como consequência lógica, não parece o modelo atual de direito ci- vil constitucional querer preservar um elevado padrão de vida, um padrão de luxo ou conforto exacerbado. Não soa razoável permitir que o devedor mantenha um alto padrão de vida, com moradia de alto conforto e luxo, em detrimento de seus credores, que podem vir a sofrer um comprometimento no seu próprio padrão de vida. Vale destacar que a propriedade privada sofre a limitação da sua fun- ção social, o que decorre de previsão constitucional. De tal modo, não pode esse direito ser utilizado como subterfúgio para conservação de um padrão de vida luxuoso, impossibilitando a satisfação de uma responsabilidade pa- trimonial legitimamente cobrada em juízo. Parece estar inserida dentro da função social a ideia de que as dívidas devem ser satisfeitas na vida em co- munidade. Somado a isso, o direito à moradia não pode ser entendido de modo amplificado a ponto de salvaguardar uma moradia luxuosa. A moradia precisa ser adequada à concepção de dignidade e de patrimônio mínimo. O princípio da proporcionalidade, embora não tenha previsão expres- sa em nossa Constituição, é de ampla aceitação e importa em uma análise do respeito a três subprincípios, a saber: adequação, necessidade e propor- cionalidade em sentido estrito (SARMENTO; NETO, 2014. p. 471). As- sim, embora possa-se considerar que a impenhorabilidade seja uma medida adequada à proteção da moradia, ela não é proporcional se, no caso concre- to, o bem protegido for luxuoso, pois há, nessa hipótese, uma alteração na balança e o sacrifício não é compensado por benefício entre o bem jurídico tutelado. Acaba que o direito a um patrimônio vasto, excedendo o limite do necessário a um padrão médio de vida digna é tutelado, com o sacrifício da pretensão legítima do credor. Curioso notar que o projeto que resultou na Lei nº 11.382/2006 al- mejava inserir um parágrafo único no art. 650 do Código de Processo Civil, estabelecendo nova regra que limitava a impenhorabilidade ao bem de fa- mília que não excedesse 1.000 (um mil) salários-mínimos. No entanto, esse trecho do projeto foi vetado, com as seguintes razões: (...) o Projeto de Lei quebrou o dogma da impenhorabilidade ab- soluta do bem de família, ao permitir que seja alienado o de valor
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