Direito em Movimento - Volume 20 - Número 2 - 2º semestre - 2022
168 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 20 - n. 2, p. 164-177, 2º sem. 2022 ARTIGOS Como último exemplo, este serve de introdução à teoria do terceiro cúmplice. Apesar de não constar expressamente no Código Civil brasileiro de 2002, vigora o princípio da eficácia (específica) relativa dos contratos, ou seja, o contrato é lei tão somente entre as partes contratantes, não afetando terceiros. Apesar dos efeitos jurídicos serem específicos (= relatividade), o contrato é um negócio inserido no ambiente social e, portanto, todas as suas fases ocorrem em meio a muitas outras interações intersubjetivas, as quais podem ser afetadas pelo negócio contratual. É sob essa ótica que, basea- do na doutrina francesa, Antonio Junqueira de Azevedo ( in AZEVEDO, 2004, p. 142) e Roberta Mauro Medina Maia (2013, p. 160-162) diferen- ciam a oponibilidade stricto sensu (= eficácia genérica de reconhecimento social) da relatividade (= eficácia específica e visada pelos figurantes). Isso quer dizer que o fato de o contrato ter efeitos específicos entre os contra- tantes não significa que possa a relação ser sabotada por terceiros. 3. O TERCEIRO CÚMPLICE A teoria do terceiro cúmplice tem seu desenvolvimento no âmbito contratual e diz respeito a situações nas quais sujeitos alheios aos figurantes, ao próprio negócio e à sua consequente relação exerce atos que, de alguma forma, violam a continuidade contratual. Acerca dessa hipótese, constam dois brocardos romanos que fundaram a ideia de que nenhum contrato pode atingir o patrimônio alheio: res inter alios acta, neque nocet neque prodest (a coisa pactuada entre outros nem aproveita nem beneficia), e nemo alteri stipulare potest (ninguém pode estipular para terceiro). Apesar das referências acima terem suas fundações no modelo do civil law , a figura do terceiro cúmplice no inadimplemento remete ao sistema do common law , trazendo Deepa Varadarajan (2001, p. 735-760) e Bianca Gar- della Tedeschi (2008, p. 10-11), que tratam da tortius interference a partir de caso ocorrido na Inglaterra do século XIX. Trata-se do case Lumney vs. Gye (1853), no qual a cantora Iohanna Wagner foi contratada com cláusula de exclusividade por Benjamin Lumley para se apresentar por três meses no Her Majesty’s Theatre . No entanto, a cantora foi induzida a romper o contrato por Frederick Gye, do Coventh Garden Theatre , que prometeu re-
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz