Direito em Movimento - Volume 20 - Número 2 - 2º semestre - 2022
156 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 20 - n. 2, p. 146-163, 2º sem. 2022 ARTIGOS da realidade física. Do ponto de vista da concepção determinista, de um mundo regido pela ação de forças cegas, o jogo seria inteiramen- te supérfluo. Só se torna possível, pensável e compreensível quando a presença do espírito destrói o determinismo absoluto do cosmos. A própria existência do jogo é uma confirmação permanente da natu- reza supralógica da situação humana. Se os animais são capazes de brincar, é porque são alguma coisa mais do que simples seres mecâ- nicos. Se brincamos e jogamos, e temos consciência disso, é porque somos mais do que simples seres racionais, pois o jogo é irracional. Desde os “jogos” de guerra (cujo prêmio é a soberania de um Estado), regidos por normas jurídicas, até os “jogos” de fé (cujo prêmio é a salvação da alma imortal), regidos por regras morais existentes na maioria das reli- giões organizadas, o jogo é elemento fundamental da cultura, o que revela traços não apenas historiográficos na teoria proposta por Huizinga, mas principalmente filosóficos. Considera-se, neste estudo, pois, que Huizin- ga apresentou à comunidade acadêmica tese em sua obra alinhada tanto à História quanto à Filosofia. As considerações de Carnio (2021, p. 157) à teoria desenvolvida por Huizinga tornam-se, pois, relevantes nesse momento, a fim de se promover um comprovar sua capilaridade no Direito, bem como a própria natureza muitas vezes jocosa deste, na medida em que se prende a paradigmas e in- terpretações do tempo presente deslocados da realidade social: Precisamos explorar mais os conceitos de jocus e o ludus no direito, é tempo de brincarmos, fazermos troça, chiste, tal qual fez seriamente Jhering com suas críticas aos teóricos e filósofos do direito.Trazendo para o plano de nosso País, em que agora temos visto insistente- mente um trabalho para a construção de uma “jurisprudência dos princípios” e de uma “teoria da decisão judicial” que merece mesmo troça –, pois o que impera ali é algo como o que ocorria no céu dos conceitos jurídicos e na Santíssima Trindade: somente os eleitos po- dem ver, já que, no fundo, o que se impõe é a questão de princípios, a questão dos princípios, que nada mais é do que a do principal, do soberano, do príncipe e do principado que mantém a estrutura da captura da nossa violenta racionalidade, aquela mesma que reverbera e sustenta, dentre outras falácias, um modo propriamente violento
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