Direito em Movimento - Volume 20 - Número 2 - 2º semestre - 2022
103 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 20 - n. 2, p. 82-110, 2º sem. 2022 ARTIGOS A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça estava pacificada quando havia o consumo de gênero alimentício em condições impróprias. Porém a Terceira Turma passou a reconhecer o dano extrapatrimonial inde- nizável para a hipótese em que corpo estranho fosse encontrado no invólu- cro do produto alimentício, ainda que não houvesse a ingestão do produto – de outro lado, a Quarta Turma entendia que esse caso não ensejava o dever de indenizar por dano extrapatrimonial. No julgamento do REsp 1.899.304/SP (relatora ministra Nancy An- drighi, DJ 25/08/2021), as Turmas reunidas na Segunda Seção uniformi- zaram a jurisprudência. Na ocasião, havia corpos estranhos (fungos e ácaro) dentro de um pacote de arroz. Ainda que o consumidor não tivesse ingerido o alimento, o risco da atividade foi considerado suficiente para a conde- nação do fornecedor ao pagamento de indenização por dano extrapatri- monial. O Tribunal reputou necessária a proteção da segurança alimentar correlacionada à qualidade dos alimentos para a garantia de controle dos riscos para a saúde das pessoas. O Código de Defesa do Consumidor trata da “Qualidade de Produtos e Serviços, da Prevenção e da Reparação dos Danos”, existindo uma zona de penumbra indissociável que teoricamen- te separa a responsabilidade pelo fato do consumo (art. 12 do CDC) e a responsabilidade pelo vício do consumo (art. 18). No voto condutor, ale- gou-se: “Não obstante, em que pese esses sentimentos negativos derivados da exposição ao alimento contaminado/violado realmente sejam aptos a causar abalo psicológico, é imperioso considerar que, nos últimos anos, a jurisprudência desta Corte, incorporando a doutrina desenvolvida acerca da natureza jurídica do dano moral, tem cada vez mais reconhecido a pos- sibilidade de compensação independentemente da demonstração da dor ou sofrimento, concluindo que o dano moral se traduz em consequência in re ipsa , intrínseca à própria conduta que injustamente atinja alguns dos aspectos da dignidade do ser humano.” Em voto-vista, o ministro Marco Buzzi ressalvou alguns aspectos da fundamentação, alertando que o dano moral não poderia ser consi- derado independente de prova ( in re ipsa ), mas deveria ser aferido no caso concreto:
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