Direito em Movimento - Volume 20 - Número 1 - 1º semestre - 2022

88 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 20 - n. 1, p. 70-93, 1º sem. 2022 ARTIGOS Doravante, “a promessa de dar livre expressão à voz do povo é carac- terística central do populismo.” Os governantes apelam para o povo para conseguir apoio para eleger determinada classe ou para promover ideias, em detrimento de outra convicção política ou de outro grupo social. Por inter- médio dessa jogada retórica, eles reivindicam para si o monopólio moral da representação por meio do apoio popular, consagrando-se o único que consegue satisfazer a vontade popular e que luta contra a opressão do anseio geral. E, certamente, Donald Trump quis expressar exatamente isso quando afirmou: “A única coisa importante é a unificação do povo, porque os outros não significam nada.” (MOUNK, 2019, p. 56). Os populistas são parciais desde o momento em que concorrem às eleições, dirigindo ira a segmentos éticos ou religiosos diferentes, que, para eles, não correspondem ao povo real. Como consequência, atingem as ins- tituições que os defendem e ameaçam a sua existência, principalmente se ousarem questionar sua representação como legítima. Com frequência, a guerra às instituições independentes inicia com o ataque à liberdade de im- prensa, com o objetivo de dominar o conteúdo das mídias sociais e veicular apenas atributos favoráveis à sua permanência (MOUNK, 2019). Portanto, não há como negar a coesão entre liberalismo e democracia, não apenas em virtude de difundir a vontade popular e da adesão de um Estado de Direito, mas também se atrela à proteção aos direitos individuais, assegurando que os ricos não sejam desleais com os desfavorecidos. Com efeito, as eleições só podem ser consideradas justas se houver autonomia da imprensa para criticar (de forma honesta e proba) e quando os direitos in- dividuais das minorias forem respeitados. Outrossim, uma democracia sem liberdade é uma “democracia sem direitos” e, em decorrência disso, constitui uma tirania da maioria. Em contraste, “direitos sem democracia” represen- tam o povo sem voz e a exclusão da vontade popular (MOUNK, 2019). Por conseguinte, a Constituição representa o documento hábil para cumprir a meta democrática de organização do Estado, distribuição e se- paração dos poderes, reconhecimento dos direitos fundamentais e exclusão da arbitrariedade do poder, porque ela nasceu com esse intuito. Logo, não adianta ser calcada como norma no seu aspecto formal e se esquecer do

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