Direito em Movimento - Volume 20 - Número 1 - 1º semestre - 2022

73 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 20 - n. 1, p. 70-93, 1º sem. 2022 ARTIGOS disseminar a sua forma de governo cunhado de ideais totalitários. Por meio disso, a população fica à mercê de governantes que não prezam pelos di- reitos fundamentais nem pelas cláusulas pétreas que mantêm as bases da democracia, e que usurpam do seu poder político para conseguir tirar a autonomia republicana das instituições independentes. 2. O DESVIRTUAMENTO DO CONCEITO DE REPÚBLICA MINA SUA LEGITIMIDADE Habitua-se a intercambiar o conceito de república com o de demo- cracia. Não obstante serem termos complementares e representarem uma organização política desejável, não são sinônimos. Há democracias não republicanas , também conhecidas como monarquias constitucionais; bem como há repúblicas não democráticas , que não merecem nem serem referidas como repúblicas (RIBEIRO, 2008). “E como a forma e o estado de uma República dependem daqueles que detêm a soberania”, há vários tipos de repúblicas (BODIN, 2011, p. 328). No entanto, a experiência republicana caminha em um elo conjunto com a raiz democrática e se consubstancia nas ideias de liberdade, justiça e direitos humanos, em que as pessoas que dela fazem parte, reconhecem-se como cidadãos – agentes iguais na esfera política – não pelos governantes, mas pela lei. Nesse sentido, desatrela-se a ideia democrática dos vícios ou virtudes dos governantes, para atribuir à qualidade das instituições. E, no mesmo sentido, enquanto cabe ao modelo teológico-político a experiência da heteronomia, “a república democrática tem a marca da autonomia”, isto é, conforme preceitua Claude Lefort, seria a capacidade de desembrica- mento do arquétipo monárquico da Idade Média – cujo líder político era figura divina – da dimensão política (MATOS, 2003, p. 47). Bodin (2011, p. 71 e 73) conceitua a república como “um reto gover- no de vários lares e do que lhes é comum, com poder soberano”. Segundo o autor, por meio do conhecimento do fim e da descrição da república, é possível saber o trajeto que se percorre para alcançá-la. Por isso os anti- gos – Cícero e Aristóteles –, quando se referiam à república como “uma sociedade de homens reunidos para bem e felizmente viver”, retraíam-se a

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