Direito em Movimento - Volume 20 - Número 1 - 1º semestre - 2022

27 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 20 - n. 1, p. 15-40, 1º sem. 2022 ARTIGOS A propósito da circunstância solidária mencionada, Gadamer apro- funda seus questionamentos acerca do movimento proporcionado pela lin- guagem como meio para a compreensão nos seus mais diversos campos – imergindo especialmente no horizonte da conversa, cuja teia de significados se radicaria externamente ao âmbito contingencial e cotidiano, a exemplo da leitura silenciosa do texto escrito, segundo a qual Platão sintetizou como essência do pensamento. Mediante esse contexto universal comunitário da linguagem, a coisa, conseguintemente, deve fazer-se valer, por si mesma, independentemente de qualquer ação subjugadora do intérprete sobre ela. “Mas essa neutralida- de não pressupõe nem uma ‘neutralidade’ com relação à coisa nem tampou- co um anulamento de si mesma.” (GADAMER, 2016, p. 358). É preciso, antes de tudo, que o ser-aí do intérprete ouça a voz silenciosa da consciên- cia, e abandone seu campo de referência mediano calcado na indecisão de- caída no horizonte hermenêutico estagnado, a fim de que todos os sentidos formados pela tradição nesse terreno sejam articulados pela interpretação cuja responsabilidade lhe caiba a cada instante. Nessa ótica, a linguagem faz da mediação o modo fundamental de expressão do homem (ser-aí) em relação à descoberta verdade do ser de um ente como fenômeno. Um espanto extasiante, a admiração vibrante, ou ainda o ver-se sem palavras diante da manifestação da coisa em si, tudo isso vem à tona como ocasionalidades, nas quais sobreleva o início do esforço de nossa compreensão. A provocação do pensar hermenêutico-fenomeno- lógico incita a pergunta autêntica, comportando algo originário na comu- nicação comunitária, portanto, transcendental e compartilhada; a morada do ser, na linguagem, é fonte donde se origina a existencialidade, o mais pulsante dos fenômenos ontológicos em seu movimento no mundo descer- rado do aí. Por isso, Gadamer reafirma a premissa de que “[...] todo esforço de querer compreender começa quando nos deparamos com algo estranho, provocante e desorientador.” (1970, p. 143). Logo, do diálogo hermenêuti- co, repercute no falar sob o prisma do desvelamento da essenciação de um ser escondido no abismo entre ele e o ente. Ao radicalizar com a inquietude originária provocada pela pergunta bem refletida e orientadora de sentido,

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