Direito em Movimento - Volume 20 - Número 1 - 1º semestre - 2022
17 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 20 - n. 1, p. 15-40, 1º sem. 2022 ARTIGOS as investigações heideggerianas, nós, como seres humanos finitos e desti- tuídos de natureza originária, esquecemo-nos, no mais das vezes, do nosso poder-ser, conforme nossas próprias possibilidades, a cada vez que somos. Isso sucede, pois absorvemos, de forma meio que automática, a lida cotidia- na de acordo com o horizonte sedimentado, articulado por sentidos dados por tradição. Justamente nessa linha fenomenológico-hermenêutica, vem à tona o fio condutor da investigação para revelar que, uma vez obscurecido o primado ôntico-ontológico do ser-aí, o intérprete se vê carregado por uma restrita circunvisão mediana, por meio da qual esse ser cotidianamente não pode vislumbrar, de início e na maioria das vezes, a temporalização do si, como poder-ser finito mais próprio e originário que é o dele, recaindo, assim, na mediania da absorção do campo de sentidos previamente dados pela tradição de horizonte encurtado. Agindo a cada experiência com a noção de tradição e historicidade, o intérprete do Direito deve almejar, no entanto, o objetivo propriamen- te dito de revelação dos fenômenos e entes por si subsistentes que lhe vem ao encontro, numa linguagem compartilhada com os demais seres -aí, quebrando dogmas encrostados repetidamente argumentados, desde sempre, tanto na cotidianidade do ofício forense como no aprendizado técnico-teórico. Consoante o tema discutido, o modo de ser cotidiano impróprio da mecanicidade acadêmica e forense de atividades essencial- mente repetitivas, desde sempre, revela-se desprovido de um caráter mais radical do pensar a diferença ontológica de ser do Direito. Portanto, esse modo de atuação mostra-se ainda despreparado para a assunção mais ex- pressiva das possibilidades de leitura do texto constitucional democrático, orientado por uma virada efetivamente concretizadora de direitos fun- damentais, programas e planos radicais de exaurimento das distorções sociais distanciadoras chocantes, ainda mantidos e cristalizados pelos mesmos mecanismos de dominação deduzidos pelo senso comum dos juristas, obscurecidos pelo véu dominador do discurso tradicional impen- sado sobre o Direito. Nesse horizonte de investigação, o ensaio deseja saber se, realmente, surge como viável algummodo de transformação pela interpretação do mun-
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