Direito em Movimento - Volume 20 - Número 1 - 1º semestre - 2022

169 ARTIGOS Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 20 - n. 1, p. 158-187, 1º sem. 2022 3. A IMPLANTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS A PARTIR DA LEI MARIA DA PENHA Não é possível abordar o enfrentamento da violência doméstica contra a mulher sob a perspectiva da Lei Maria da Penha sem antes apresentar um pequeno recorte histórico sobre a luta do movimento feminista brasileiro nessa conquista. No final da década de 1960 e no decorrer das décadas de 1970/1980, em especial com o assassinato de Ângela Diniz por seu companheiro Doca Street em 30 de dezembro de 1976, bem como, com a dupla tentativa de homicídio de Maria da Penha também por seu companheiro, o movimento feminista passou a encampar as lutas sociais decorrentes das desigualdades de gênero. Segundo Mello (2019, p. 33), “a década de 1980 foi próspera em expe- riências inovadoras, articuladas por feministas e mulheres organizadas em diferentes movimentos, que resultaram na constituição de uma importante agenda nacional de combate à violência contra a mulher no Brasil”, como, por exemplo a implantação, em 1985, da primeira Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher, no Estado de São Paulo. Como já mencionado anteriormente, o divisor de águas e grande marco jurídico na defesa dos direitos das mulheres no Brasil foi, sem dúvida, a Cons- tituição Federal de 1988. A Assembleia Nacional Constituinte de 1987, com- posta por 559 membros, teve apenas 26 mulheres. Num primeiro momento, pode até parecer um número inexpressivo, mas foi bastante significativo, uma vez que, na elaboração da Constituição de 1946, a última democrática antes de 1988, não houve a participação de nenhuma mulher (TELES, 2017). Quanto à dupla tentativa de assassinato da farmacêutica e bioquímica Maria da Penha Maia Fernandes em 1983 por seu companheiro, diante da demora no seu julgamento e da inefetividade do sistema judicial brasileiro por quase duas décadas, em 1998, Maria da Penha, com a ajuda do movi- mento de mulheres, encaminhou uma denúncia contra o Estado brasilei- ro perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da OEA, em conjunto com o Centro pela Justiça e o Direito Internacional

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