Direito em Movimento - Volume 20 - Número 1 - 1º semestre - 2022
132 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 20 - n. 1, p. 120-142, 1º sem. 2022 ARTIGOS em análise através do Judiciário. A discussão do caso pela Equipe Técnica atuante na Vara da Infância evidenciou a inexistência de um consenso so- bre a postura a ser adotada diante da situação concreta apresentada, não apenas pelo seu ineditismo, mas principalmente pela demanda de contato pós-adoção não ter sido proveniente da própria adotada. Conforme rela- tado, o atendimento foi iniciado sob intensos questionamentos técnicos e éticos, essencialmente frente à insegurança quanto aos desdobramentos da intervenção demandada. Assim, entendemos que, à semelhança do que foi vivenciado pelos integrantes da Equipe Técnica da vara, incertezas possam surgir também entre magistrados, promotores de justiça, defensores públi- cos e advogados, considerando-se a ausência de discussões sobre a amplitu- de do direito às origens. Importante destacar que o direito às origens pode ser elencado no hall dos direitos humanos e tem amparo não somente no Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), mas também em convenções internacionais, como a convenção de Haia, da qual o Brasil é signatário. Ele pode ser associado ao direito fundamental de identidade, que abarca ainda o princípio da dig- nidade da pessoa, previsto na Constituição da República. Assim, embora a adoção rompa os laços de filiação do adotado com sua família de origem, outros laços podem vir a permanecer. Nesse sentido, é importante destacar que o direito às origens abrange o patrimônio genético, mas também ele- mentos socioculturais, englobando, portanto, aspectos existenciais e reper- cussões psíquicas (M. Vieira, Comunicação Pessoal, 05/05/2021). Sob esse aspecto, Fonseca (2009) indaga sobre o papel do Estado no controle de informações que dizem respeito à filiação e à identidade, desta- cando ser esta uma questão atinente aos direitos humanos.Tais ideias pare- cem-nos valiosas para a compreensão do papel do Judiciário na operaciona- lização do acesso às origens pelos interessados. Fonseca (2010), ao analisar a interação entre adotados adultos em busca de suas origens biológicas e as figuras de autoridade que detêm informações sobre elas, expõe que: “As consequências dos dispositivos legais dependem menos da lei formal do que dos mecanismos procedimentais que regem o aparato judicial no seu dia a dia” (p. 494).Tal afirmativa corrobora a importância de se pensar sobre
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