Direito em Movimento - Volume 20 - Número 1 - 1º semestre - 2022

115 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 20 - n. 1, p. 107-119, 1º sem. 2022 ARTIGOS Dessa maneira, considerando o conteúdo do entendimento fixado pela Suprema Corte quanto à responsabilização de agentes públicos por atos re- lacionados ao enfrentamento da pandemia do coronavírus no julgamento da ação direta que questionou a constitucionalidade de medida provisória, sobressai uma condicionalidade importante para o administrador ao adotar políticas públicas em tempos de crise: a observância de normas e critérios técnicos e científicos. Pode-se falar em condicionalidade para as políticas públicas em tem- pos de crise porque, caso o agente público produza atos que não considerem as normas técnicas e científicas estabelecidas por entidades e organismos internacionais ou nacionais de reconhecido saber na área, estará, pois, sujei- to à responsabilização. No caso da pandemia da covid-19, a adoção de políticas públicas de saúde sem observância das normas técnicas e dos critérios científi- cos emanados por órgãos como ANVISA, Instituto Butantan, Fundação Oswaldo Cruz ou Organização Mundial de Saúde sujeitaria o gestor à responsabilização. Acaso teria o STF retirado a discricionariedade administrativa 8 ine- rente ao administrador público para escolher e implementar a política pú- blica mais conveniente e oportuna em tempos de crise? A resposta deve ser negativa. Não é que o agente público, o policy maker , tenha perdido a dis- cricionariedade para optar por tal ou qual política pública, mas antes uma recondução, em tempos de crise, à discricionariedade técnica 9 . Em situação de emergência pública, de calamidade e de crise sanitá- ria generalizada, as margens do gestor para opção de qual política pública adotar estreitam-se para um juízo técnico e científico, pois, do contrário, a prerrogativa jusadministrativa da discricionariedade ampla poderia condu- 8 “Discricionariedade, portanto, é a margem de liberdade que remanesça ao administrador para eleger, segun- do critérios consistentes de razoabilidade, um, dentre pelo menos dois comportamentos cabíveis, perante cada caso concreto, a fim de cumprir o dever de adotar a solução mais adequada à satisfação da finalidade legal, quando, por força da fluidez das expressões da lei ou da liberdade conferida no mandamento, dela não se possa extrair objetivamente uma solução unívoca para a situação vertente” (MELLO, 1993, p. 48). 9 Para Maria Sylvia Zanella Di Pietro, se a lei utiliza conceitos técnicos, não há discricionariedade propriamente dita, não haverá opções a serem feitas por critérios de oportunidade e conveniência, não haverá decisão política a ser tomada conforme avaliação do interesse público, existindo, somente uma única solução a ser adotada com base em critérios técnicos fornecidos pela ciência (DI PIETRO, 2012, p. 119-124).

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