Direito em Movimento - Volume 19 - Número 2 - 2º semestre - 2021
55 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 19 - n. 2, p. 42-70, 2º sem. 2021 ARTIGOS A alternativa torna-se ainda mais atraente quando se verifica que o ha- beas corpus não se submete a quaisquer dos estritos requisitos estabelecidos para o recurso extraordinário. Não há necessidade de prequestionamento, tampouco de esgotamento das vias ordinárias, muito menos de pagamento de custas recursais. Não há sequer necessidade de regular representação processual, visto que o habeas corpus pode ser impetrado por qualquer pes- soa, ainda que não seja advogado. Não espanta, portanto, que essa tenha se tornado a via processual preferencial para quem quer discutir constitu- cionalidade de leis, quando estiver em jogo matéria afeita ao Direito Penal (NUCCI, 2014, p. 179). Conclui-se, pois, que, ao lado dos instrumentos ordinários de controle de constitucionalidade concreto, há agora mais um: o habeas corpus . II.2.4 O caso do HC nº. 82.959/SP Exemplo mais gritante dessa nova modalidade de controle de consti- tucionalidade incidental ocorreu no julgamento do HC nº. 82.959/SP. Consoante determina o texto constitucional, incumbia ao legislador ordinário estabelecer um rol de crimes denominados “hediondos” 22 .Ao lado da tortura, do terrorismo e do tráfico ilícito de entorpecentes, tais crimes seriam insuscetíveis de fiança, graça ou anistia (BRASIL, CRFB, 1988). Em obediência ao comando da Constituição, o legislador promulgou a Lei nº. 8.072/90, a definir quais tipos seriam tidos como hediondos, assim como regular sua tramitação processual. Além de aumentar a pena de di- versos delitos, o legislador apôs na lei uma severa restrição para os condena- dos nesse gênero de crime: a pena deveria ser cumprida integralmente em regime fechado (§1º, do art. 2º, da Lei nº. 8.072/90). É dizer: ao contrário 22 A denominação de “hediondo” a determinados crimes foi criticada desde sempre pela doutrina. Como o próprio vocábulo insinua, “hediondo” seria aquilo que provoca repulsa moral, horror, características inerentes a todo e qualquer delito. Logo, seria estranho estabelecer um rol de crimes hediondos por permitir a conclusão, a contrario sensu , de que há crimes que não provocam semelhante repulsa. Na verdade, a vagueza do termo sequer permite diferenciar os delitos quanto à sua gravidade objetiva ou mesmo o modo de execução do crime. Resta-nos, portanto, aceitar resignadamente que a definição de hediondo não obedecerá qualquer “critério vá- lido, mas sim aquele crime que, por um verdadeiro processo de colagem, foi rotulado como tal pelo legislador” (FRANCO, Alberto Silva. Crimes hediondos. 6ª ed. São Paulo: RT, 2007, p. 95-96).
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