Direito em Movimento - Volume 19 - Número 2 - 2º semestre - 2021
51 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 19 - n. 2, p. 42-70, 2º sem. 2021 ARTIGOS II.2.2 O cabimento no caso de Tribunal Superior como au- toridade coatora Em relação à segunda hipótese, no entanto, as dúvidas são de gran- de relevo. Dado que a Constituição determina que o Supremo julgará os habeas corpus quando a autoridade coatora for Tribunal Superior 12 , parece evidente que somente nos casos em que houver persecução penal originária por parte desses tribunais estaria o STF autorizado a investigar seus atos coatores. Todavia, não é bem isso o que ocorre na prática. Valendo-se da sagacidade da classe advocatícia e de uma prática ju- risprudencial permissiva, o Supremo tornou-se virtualmente o estuário de todo e qualquer habeas corpus impetrado no Brasil. Servindo-se do “ga- rantismo” dos tribunais e de uma certa leniência dos julgadores em não contestar uma situação esdrúxula pelo simples fato de estar “consolidado o entendimento”, o processo penal deixou de obedecer a uma lógica simples de “decisão-recurso” para transformar-se em um festival de habeas corpus impetrados sucessivamente em “cascata” (NUCCI, 2014, p. 57). Não im- porta se o cidadão dispõe ou não de foro por prerrogativa de função. Seu habeas corpus terá um só destino: o Supremo Tribunal Federal. Mas como isso ocorre? Imagine-se, por exemplo, um sujeito submetido a inquérito pela Po- lícia Federal. Por identificar ilegalidades na investigação, o investigado im- petra habeas corpus perante o Poder Judiciário federal local. Se a ordem for denegada, competiria à parte interpor recurso em sentido estrito perante o Tribunal Regional Federal correspondente 13 . Ao invés de proceder dessa forma, a parte apresenta novo habeas corpus , dessa feita perante o próprio TRF. A ideia, claro, é abreviar a apreciação do pedido e atalhar a tortuosa 12 Embora a Constituição não os mencione expressamente, somente dois Tribunais Superiores dispõem de competência em matéria penal: o Superior Tribunal de Justiça e o Superior Tribunal Militar. A distinção entre ambos, nesse particular, reside fundamentalmente na competência restrita deste último para julgar os crimes militares próprios (cf. art. 105, inc. I, 123 e 124 da Constituição Federal de 1988). Sobre o tema, cf. SILVA, José Afonso da. Op. Cit., p. 589. 13 Cf. art. 581, inc. X, do Código de Processo Penal. Nesse sentido, cf. HETSPER, Rafael Vargas. O remédio do momento: habeas corpus. Disponível em http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=artigos_leitu- ra_pdf&artigo_id=2272. Acesso em 24 abr. 2017.
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