Direito em Movimento - Volume 19 - Número 2 - 2º semestre - 2021
48 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 19 - n. 2, p. 42-70, 2º sem. 2021 ARTIGOS SANTANA, 2008, p. 34). De outra banda, a doutrina tradicional renegava a ampliação do escopo do instrumento, circunscrevendo-o às hipóteses de verdadeira prisão ilegal (AGRA, 2014, p. 34). Prevaleceu, afinal, a posição intermediária, defendida por Pedro Lessa e Pontes de Miranda. O enten- dimento intermédio restringia o cabimento do habeas corpus aos casos de limitação indevida do direito de ir e vir, mas também entendia cabível seu manejo “para proteger direitos que tivessem na liberdade física condição necessária para seu gozo” (FOPPEL e SANTANA, 2008, p. 35). O habeas corpus , portanto, expressa-se fundamentalmente na defesa de um mesmo direito (locomoção) em três dimensões: ir, vir e permanecer (FOPPEL e SANTANA 2008, p. 35). Por isso mesmo, admite-se o habeas corpus em casos de violência real, coação de liberdade e mesmo contra a mera ameaça de praticar um mal destinado a violar o direito de ir e vir alheio (NUCCI, 2014, p. 35 e ss). No primeiro caso, teremos o habeas corpus liberatório; no segundo, o habeas corpus preventivo (FACHIN, 2015, p.317). Embora esteja previsto no Código de Processo Penal, no capítulo rela- tivo aos recursos, não há maiores controvérsias quanto à sua natureza de ação (NUCCI, 2014, p. 22). Trata-se de remédio constitucional dotado de “au- tonomia própria e de cunho mandamental” (FERNANDES, 2011, p. 443). Ao contrário dos recursos em geral, que pressupõem a litispendência , isto é, a existência de um processo-base no qual serão interpostos, o habeas corpus pode ser empregado mesmo quando não haja qualquer processo judicial, mas simplesmente a ameaça – real ou potencial – de que a liberdade de loco- moção do sujeito possa ser cerceada (FOPPEL e SANTANA, 2008, p. 36). O habeas corpus pode ser ajuizado por qualquer indivíduo, em defesa de interesse próprio ou alheio, ou pelo Ministério Público, independente- mente de maiores formalidades (MARQUES , 1997, p. 376). O impetrante pode inclusive ser pessoa analfabeta, desde que haja assinatura a rogo 9 . Não há sequer a necessidade de observância do jus postulandi , franqueando-se literalmente a qualquer pessoa o seu ajuizamento (AGRA, 2014, p. 243); 9 A benevolência com a qual se interpreta essa garantia permite que se possa cogitar habeas corpus protoco- lizados por “telegrama, radiograma ou telex, por telefone e reduzido a termo pela secretaria” e até mesmo sua “impetração pela via eletrônica do e-mail” (FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Op. Cit., p. 444).
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