Direito em Movimento - Volume 19 - Número 2 - 2º semestre - 2021
245 ARTIGOS Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 19 - n. 2, p. 237-260, 2º sem. 2021 ferencial dos outros estados do Sudeste, como Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. Portanto, no início do século XX, o território capixaba era composto por uma densa Mata Atlântica, que cobria toda a extensão de um relevo acidentado, onde predominavam as montanhas da Serra do Mar. Com a chegada dos imigrantes italianos, deu-se a ocupação desse último estado no Sudeste. Nele, era preciso ocupar, registrar e demarcar as terras existentes. Todavia, várias dificuldades eram encontradas, como a densidade da Mata Atlântica, o contato com os índios, o relevo acidentado, a falta de instrumentos para iniciar a lavoura e o desconhecimento sobre a utilização dos instrumentos que auxiliavam a demarcação. Como mencionamos anteriormente, Graça Aranha era juiz de direito na Comarca de Santa Leopoldina, cidade portuária por onde os imigrantes desembarcavam para ocupar as terras no interior do Estado. Sua obra Canãa é classificada como realista, pois retrata com detalhes questões sociais e cul- turais do período no qual o enredo da história se desenvolveu. Logo, Graça Aranha se utilizará de seus conhecimentos como juiz de direito daquela comarca para embasar o plano de fundo do romance entre Maria e Milkau. Nesse contexto social, podemos perceber questões relativas à ocupação do território capixaba, que produzem seus efeitos até os dias atuais. Em um dos trechos da obra, a personagem de Milkau descreve o seu sentimento sobre derrubar a mata para estabelecer em seu lugar o cafezal: (...) Compreendo bem que é ainda a nossa contingência essa ne- cessidade de ferir a Terra, de arrancar do seu seio pela força e pela violência a nossa alimentação; mas virá o dia em que o homem, adaptando-se ao meio cósmico por uma extraordinária longevida- de da espécie, receberá a força orgânica da sua própria e pacífica harmonia com o ambiente, como sucede com os vegetais; e então dispensará para substituir o sacrifício dos animais e das plantas. Por ora nos conformaremos com este momento de transição... Sinto do- lorosamente que, atacando a Terra, ofendo a fonte da nossa própria vida, e firo menos o que há de material nela do que o seu prestígio e imortal na alma humana ... (ARANHA, 1982, p. 92)
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