Direito em Movimento - Volume 19 - Número 2 - 2º semestre - 2021

188 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 19 - n. 2, p. 183-210, 2º sem. 2021 ARTIGOS A partir da previsão dos direitos da natureza, de forma inédita no sistema legal mundial, na Constituição do Equador de 2008 e, após, na Constituição da Bolívia de 2010, muitos partidários da tutela da natureza começaram a se autodeclarar como não antropocêntricos. A origem do termo “direitos da natureza” não foi idealizada pelas Cartas do Equador e da Bolívia, mas pelo professor da Universidade da Califórnia Roderick Nash, em 1989, no livro Rights of nature: a history of Environmental Ethics. Tempos depois recebeu adeptos como Henry Tho- reau (final do séc. XIX), Rachel Carson e Aldo Leopold (primeira meta- de do séc. XX) e, ultimamente, Arne Naess, George Sessions, Bill Devall, Theodore Roszak e Alan Drengson (LOURENÇO, 2013, p. 188). Os defensores dos direitos da natureza se filiam ao paradigma eco- cêntrico, utilizando o termo “ecologia profunda”, criado por Arne Naess em 1972, para se diferenciarem dos adeptos ao antropocentrismo, que usam a expressão “ecologia rasa”. O ecocentrismo tem como foco o ecossistema, ou seja, o todo, e não somente o indivíduo ou as partes, razão pela qual pode ser chamado de “ética ecocêntrica”. Contudo, mesmo os ecocêntricos acabam por se autocontradizerem, visto que suas formas de agir não diferem, de modo significativo, do para- digma antropocêntrico. É o que se passará a demonstrar. Os ecocêntricos expõem que “todo ser, animais, plantas, inclusive en- tes inanimados (montanhas), possuem valor intrínseco, isto é, valor em si, por si mesmo” (LOURENÇO, 2013, p. 189). Em razão disso, por aceitarem ser devido valor intrínseco para seres não humanos, advogam não serem antropocêntricos. Caso a declaração dos ecocêntricos no sentido de afirmarem que tais seres possuam valor intrínseco/inerente tenha algum significado relevante no mundo real, por qual razão eles admitem a matança de animais apenas para a satisfação do paladar, ou para a confecção de sapatos, ou para a cons- trução de hidrelétricas? Dessa forma, constata-se que a ética ecocêntrica está sendo incoerente com o que proclama, pois se ela efetivamente visasse

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