Direito em Movimento - Volume 19 - Número 1 - 1º semestre - 2021

46 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 19 - n. 1, p. 35-56, 1º sem. 2021 ARTIGOS cracia estaria se efetivando em consonância com os valores democráticos prezados no texto constitucional. Segundo Avritzer (2016, p.09), mencio- nado incômodo decorre de vários fatores, dentre eles, a falta de credibilida- de do presidencialismo de coalização, os limites da participação popular na política, paradoxos de combate à corrupção, aproximação da classe média das classes populares e o novo papel do Poder Judiciário na política. Tais impasses, além de outros, demonstram uma crise de crescimento e de evolução da própria cultura democrática no Brasil. Ora, em um país que se constitui em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana, valores sociais do traba- lho e da livre iniciativa, bem como pluralismo político (BRASIL, 1988), es- pera-se que as decisões políticas sejam cada vez mais próximas da população. No caso brasileiro, o art. 1º da Constituição estabeleceu a regra da maioria ao expor que “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente” (BRASIL, 1988). Acontece que, na medida em que se vive em uma sociedade pluralista organizada em tor- no de um Estado Moderno, a regra da maioria não pode ser a única admiti- da pelo ordenamento jurídico. Caso assim o fosse, as minorias, por ausência de força política suficiente para sua representação perante o Poder Público, seriam reféns permanentes da intolerância das massas. Sob esse prisma, Canotilho (1993, p. 190, 456-457) explica que, em- bora o Brasil preze pelo princípio majoritário, não se pode desprezar a pro- teção às minorias. Pelo contrário. Deve-se respeitar o pensamento alter- nativo e garantir a sua coexistência, vigorando muito mais um relativismo pragmático que possa, inclusive, reconhecer que grupos que são minoritá- rios hoje podem vir a se tornar majoritários em um futuro. O Estado Democrático de Direito comporta espaço para diversas for- mas de pluralidade jurídica. É nesse ponto que não se pode descartar a possibilidade de coexistência de normas jurídicas e normas não jurídicas dentro de um mesmo lapso temporal. E, se há essa existência mútua, deve- se buscar a harmonia entre elas, de modo que se possa garantir justiça aos destinatários das normas.

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