Direito em Movimento - Volume 19 - Número 1 - 1º semestre - 2021
249 ARTIGOS Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 19 - n. 1, p. 240-268, 1º sem. 2021 Contudo, estudiosas como Pateman (1993) e Saffioti (2015) enten- dem pela existência de um patriarcado moderno, atual e pungente. Saffioti (2015) o compreende como uma expressão de poder político e um sistema contínuo de dominação masculina em permanente transforma- ção, que incorpora as dimensões da sexualidade, da reprodução e da relação entre homens e mulheres, e perpassa todas as estruturas sociais, mantendo por vezes intactas as formas de divisão sexual do trabalho. Tem como um de seus elementos basilares o controle da sexualidade feminina, a fim de assegurar a fidelidade da esposa ao marido. Em sua investigação, Pateman (1993) considera que persiste hodier- namente a negligência que negou às mulheres as liberdades civis conferidas aos homens quando da celebração do contrato social proposto pelas teorias contratualistas, o que inaugurou o patriarcado moderno: A liberdade não é universal – é um atributo masculino e depende do direito patriarcal. [...] O contrato está longe de se contrapor ao pa- triarcado; ele é o meio pelo qual se constitui o patriarcado moderno. (PATEMAN, 1993, p. 17). A constituição e manutenção do patriarcado têm profundas relações com as várias formas de violência. Para os fins do presente trabalho, sobressai a violência simbólica, de caráter institucional, que é exercida sem coação física. Funda-se na fa- bricação contínua de crenças no processo de socialização, que induzem o indivíduo a se posicionar no espaço social seguindo critérios e padrões do discurso dominante, legitimando-o. Para Bourdieu (2014), a violência simbólica é fundamento da divisão socialmente construída entre os gêneros, fulcrada na “dominação mascu- lina”, que constrói e legitima a suposta superioridade masculina em de- trimento da inferioridade feminina. Segundo o autor, a força da ordem masculina dispensa justificação, impondo-se a visão androcêntrica como se fosse neutra, sem que nada precise legitimá-la. O princípio masculino é tomado como medida de todas as coisas, a tal ponto que
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