Direito em Movimento - Volume 19 - Número 1 - 1º semestre - 2021
170 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 19 - n. 1, p. 150-179, 1º sem. 2021 ARTIGOS Faz-se essa comparação pelo fato de que a referida emenda foi rejeita- da pelo relator do Projeto de Lei nº 2.630/2020, senador Angelo Coronel (PSD/BA), sob o argumento de que “pela natureza da Lei de Improbidade Administrativa, julgamos mais razoável enfrentar essa discussão em PL au- tônomo” (BRASIL, 2020a, p. 26), reconhecendo a ausência de vinculação temática entre a propagação de “notícias falsas” e a Lei de Improbidade Administrativa, argumento que pode ser utilizado também para o Projeto de Lei nº 632/2020, do senador Jorge Kajuru, que trata da inserção da “di- vulgação de informação que sabe ser manifestamente falsa, difamatória ou sem fundamento” na dita lei. Evidentemente, não se ignora que a propalação desse tipo de con- teúdo inverídico e difamatório é um despropósito, especialmente se levada em conta a posição ocupada por quem o faz, pois “o elemento volitivo que impulsiona o agente público em suas ações será direcionado pelas aspira- ções e pelos fins que se pretende alcançar, somente sendo legítimos os atos diretamente relacionados ao cumprimento dos deveres que recaem sobre si” (GARCIA; ALVES, 2014, p. 425) 10 . Todavia, se for realizado um exame de proporcionalidade e razoabili- dade entre as condutas e as sanções dela decorrentes – perda e inabilitação para o cargo, pela pretensão do referido projeto de lei de considerá-la como um crime de responsabilidade –, observar-se-á que, apesar do engodo e do fato de a ação ser merecedora de reprovação social e moral, a disposição como ato de improbidade administrativa e crime de responsabilidade se mostra desproporcional e irrazoável. Brasil” (art. 4º, I) –, a referida proposta tem sido alcunhada pelas mídias sociais como “lei das fake news ”, em- bora não pretenda nem disponha sobre a regulação, controle e combate às informações e “notícias falsas”. De fato, não é incomum a apelidação de leis e figuras penais pelos meios de comunicação social. Contudo, nem sempre tais terminações refletem o conteúdo e os objetivos da norma mencionada, o que leva, muitas vezes, os indivíduos à incompreensão do que está sendo tutelado e regulado, podendo levar à repulsa ou à expectativa demasiada da população em relação a esse tipo de pretensão normativa. 10 Assim, do ponto de vista das redes sociais, observa-se que “a atuação do Poder Público nas redes sociais me- rece diretrizes claras que impeçam o desvirtuamento do interesse público”. Assim, de acordo com o Projeto de Lei nº 2.630/2020, as condutas de agentes políticos passam a ter uma dimensão que extrapola o interesse individual do eleito ou da autoridade, e, por essa razão, devem respeitar os princípios da Administração, em razão da função exercida (BRASIL, 2020a, p. 10). Contudo, no caso do Projeto de Lei nº 632/2020, não há diretrizes nem delimi- tação claras, visto que a conduta tendente a ser reprimida é a “divulgação de informação que sabe ser manifes- tamente falsa, difamatória ou sem fundamento”, o que gera uma intensa margem e dificuldade de interpretação.
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