Direito em Movimento - Volume 18 - Número 3 - Edição Especial
148 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 18 - n. 3, p. 128-153, 2020 - Ed. Especial ARTIGOS ras pertencentes às comunidades remanescentes de quilombos são um dos maiores desafios nessa história de resistência. O uso e ocupação do solo é presente em todas as formas de sociedade da história da humanidade. Apesar das frequentes inovações tecnológicas, que modificam a vida e a produção no campo, cada vez mais modernos, a terra ainda possui um valor intrínseco imenso. É na terra que se dá a vida. Através dela é que se constrói a soberania do país e de cada território den- tro dele. Nesse sentido, a ocupação por comunidades quilombolas, por sua cultura e tradição de subsistência, localiza-se na contramão dos interesses privados das elites nacionais e internacionais. Uma vez que a universaliza- ção e o comércio internacional de commodities estão cada vez mais fortes, apesar das mais diversas crises sociais e sanitárias, o quilombo mais uma vez ocupa importante lugar de resistência frente a regimes neoliberais. É nesse contexto que a titulação de terras das comunidades remanes- centes de quilombo, prevista no artigo 68 do ADCT, com força constitucio- nal, insere-se como grande desafio. Segundo dados divulgados pelo INCRA, entre os anos de 2005 e 2018, apenas 125 comunidades foram tituladas, exis- tindo um total de 1.715 processos de titulação em aberto. De acordo com Tárrega, a ausência de titulação incita recorrentes conflitos dentro de um sistema jurídico que hipervaloriza a propriedade. Os números demonstram um aumento da quantidade de quilombolas mortos por conflitos agrários de 350% ao ano (2018, p. 136). Ainda de acordo com a autora: A Terra de direitos fez uma análise em 2016 segundo a qual, em 5 anos, o orçamento para a regularização dos territórios quilombolas caiu 97%. Também analisa dados de certificação/titulação, con- cluindo que, nesse ritmo, seriam mais de 900 anos para que todas as comunidades já certificadas recebessem seus títulos de propriedade (2018, p. 135). Se estão corretos os dados, a realidade é escabrosa. Um prazo de 900 anos para a titulação das terras de comunidades já certificadas representa mais um século de atraso, não só para a comunidade negra, mas para todo o país enquanto Estado democrático de direito. A ineficiência na concre-
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