Direito em Movimento - Volume 18 - Número 3 - Edição Especial

133 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 18 - n. 3, p. 128-153, 2020 - Ed. Especial ARTIGOS imperial e liberal, submetiam outros territórios de modo violento. Queiroz narra um acontecimento impactante da Revolução Haitiana que dá cabo de tamanha contradição do universalismo europeu iluminista: um rebelde foi capturado e executado poucos dias após a insurreição dos negros na ilha de São Domingos. Ocorre que “quando as tropas revistaram o seu corpo, elas encontraram em um dos seus bolsos panfletos impressos na França com pa- lavras de ordem sobre os direitos do homem e a causa sagrada da revolução” (QUEIROZ, 2017, p. 22). A Revolução Haitiana é precursora na evidenciação de que os ideais iluministas de liberdade e igualdade não estavam disponíveis para todos, uma vez que o movimento revolucionário no Haiti em 1791 seria visto com temor e suspeita e fortemente combatido. Assim, as aspirações filosóficas de pensar as diferenças na existência humana deixam de ser apenas um campo do conhecimento, tornando-se “uma das tecnologias do colonialis- mo europeu para a submissão e destruição de populações das Américas, da África, da Ásia e da Oceania” (ALMEIDA, 2019, p. 20). Infere-se dessa formação de sentido do que é raça na modernidade a afirmação de que o racismo é estrutural, uma vez que é possível perceber a necessidade de classificação e hierarquização das raças para corresponder aos objetivos dos Estados modernos e contemporâneos através de uma sis- temática de discriminação.Daí a importância dos estudos que visam a com- preender a origem e formação do Estado. Apesar da superação científica do determinismo biológico e geográfico, as consequências e a modificação dos meios utilizados para perpetuar a discriminação causarão influências de caráter permanente. É possível perceber essa atuação em momentos como o neocolonialismo ou a violência policial do século XXI, como evidenciou o movimento Black Lives Matter. Assertiva e necessária é a afirmação de Almeida nesse sentido: Ainda que hoje seja quase um lugar-comum a afirmação de que a antropologia surgida no início do século XX e a biologia – especial- mente a partir do sequenciamento do genoma – tenham há muito demonstrado que não existem diferenças biológicas ou culturais que

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