Direito em Movimento - Volume 18 - Número 2 - 2º semestre/2020
88 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 18 - n. 2, p. 73-107, 2º sem. 2020 ARTIGOS pagar a pensão em dia. Parece preocupado em mostrar que aproveitou bem o grupo e o tempo todo compara-se aos outros: “Teve gente que foi lá, que não vai adiantar nada”. Dá exemplos de dinâmicas e temas de discussão do grupo, mostra-se empolgado com o que diz ter aprendido. De todos os entrevistados, é o único que assume ter cometido a agressão e que entende o grupo como “conversão da prisão”(sic). ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Em repetidas leituras das transcrições das entrevistas, após escuta às gravações, foram identificados os principais temas para análise (BRAUN e CLARKE, 2006), a saber: (1) Estranhamento do processo penal; (2) Per- cepções e sentimentos sobre a vivência no grupo, com os subtemas “Des- confiança/Insegurança” e “Aprendizado/Mudanças”, (3) Situação atual. A seguir, comentamos brevemente cada tema, com seus subtemas e códigos. Tema: ESTRANHAMENTO DO PROCESSO PENAL – “Não sei por que estou aqui” Os entrevistados trazem afirmações recorrentes de estranhamen- to em relação ao tratamento criminal da violência denunciada por suas (ex) companheiras. “Estranhamento do processo penal” aparece, portanto, como o primeiro tema na nossa análise. Os quatro códigos que formam esse tema mostram os diversos sentidos da afirmação muito comum “Não sei por que estou aqui”: “(Des)conhecimento”, “Injustiça”, “Minimização” “Vitimização”. Assim como percebemos em nossos entrevistados, outros trabalhos afirmam ser comum os HAV apresentarem muitas questões e dúvidas sobre o processo. Esses homens não estão familiarizados com a lógica e os signos do Sistema de Justiça e do processo penal, menos ainda por serem réus primários (exigência para a suspensão da pena). Mas, pa- ralelamente ao desconhecimento do aspecto jurídico/criminal, a questão de estar sendo processado gera sentimentos de medo, raiva e indignação, expressos também na expressão “não saber” – no sentido de “não entender o que está acontecendo”.
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