Direito em Movimento - Volume 18 - Número 2 - 2º semestre/2020
126 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 18 - n. 2, p. 108-135, 2º sem. 2020 ARTIGOS geneidade e consciência da própria função, não apenas no campo econô- mico, mas também no social e político” (GRAMSCI, 1988, p. 3). É uma visão do intelectual distante da visão tradicional, escolástica, clerical, do homem de letras observando o mundo alhures de alguma montanha, com olhar falsamente desinteressado, depositário da verdade (pelas luzes, por um dom genial ou por algum essencialismo naturalista). Todos participam da produção e reprodução das ideias, todos são atravessados e atuantes na construção de representações. Com alguma sagacidade, inverte-se a visão tradicional segundo a qual o “quem” intelectual é um a priori (pela ilus- tração, pela vocação, pela posição de poder), para um outro tipo de aprio- rismo: o da não existência de um não intelectual. A famosa colocação de que todos são intelectuais embora nem todos exerçam essa função (GRAMSCI, 2001, p. 18), deve ser lida nesse sentido. Essa representação dos intelectuais gramsciana em nada se aproxima, é verdade, das autorrepresentações que os bacharéis e juristas tinham de si (arvorando-se arautos de uma modernidade nacional, os verdadeiros in- telectuais). Mas nos ajuda a compreender melhor o papel deles para além dessa autorrepresentação ( também, uma projeção de uma visão hierarqui- zada do processo social). A noção de organicidade prevê o entendimento político das relações de poder onde as ideias e os intelectuais são formados em uma realidade intrínseca ao mundo humano, e não em uma realidade especulativa e distante. Sob essa noção, as ideias têm uma carga muito mais acentuada de imanência e, porque imanente, são produzidas e divulgadas materialmente, têm seu próprio tempo histórico e estão imersas nas rela- ções de poder desse tempo. O debate sobre o conceito de intelectual se in- sere decididamente em uma perspectiva dialética da história e da ideologia (CERQUEIRA, 2008, p. 2). O recurso ao periodismo como fonte-objeto é uma forma de pensar o campo do Direito e dos intelectuais por dentro. Em um trabalho recen- te, Rodrigo Bordignon ressalta que a lógica da circulação de ideias e das disputas políticas em torno dos papeis sociais assumidos pelos formados em Direito se dá mediante a ação de três grandes grupos de carreiras de-
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