Direito em Movimento - Volume 18 - Número 1 - 1º semestre/2020

57 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 18 - n. 1, p. 51-77, 1º sem. 2020 ARTIGOS Tratar os desiguais de forma desigual talvez seja a maior das igualda- des que o ordenamento legislativo pode conceber. Exatamente por isso, em alinhamento com esse acordo de cooperação, que, em 19 de abril de 2012, no Dia do Índio, o Conselho Nacional de Justiça e o Conselho Nacional do Ministério Público assinaram a Resolução Conjunta n.º 03, para normati- zar o assento de nascimento de indígenas nos cartórios de pessoas naturais. A principal inovação dessa resolução é o enfoque diferenciado que incor- pora ao ato registral, estabelecendo, pela primeira vez no Brasil, o inafastável respeito à cultura indígena e às suas tradições ancestrais. Na verdade, garantiu a efetividade do comando previsto no artigo 231 da Constituição Federal, que ensina que “são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, lín- guas, crenças e tradições” . Em razão dessa normativa conjunta, o indígena tem direito à livre escolha de seu nome de registro, sem nenhuma restrição da sociedade não índia, como até então existia no momento da expedição da certidão de nas- cimento, por exemplo. É o que se vê no art. 2º da norma em estudo: Art. 2º. No assento de nascimento do indígena, integrado ou não, deve ser lançado, a pedido do apresentante, o nome in- dígena do registrando, de sua livre escolha, não sendo caso de aplicação do art. 55, parágrafo único da Lei n.º 6.015/73. O mencionado parágrafo único do art. 55 da Lei n.º 6.015/1973 1 au- torizava os cartórios a negarem registro a prenomes que podiam expor a ri- dículo seus portadores e foi, muitas vezes, indevidamente usado para obstar o assento de nomes tradicionalmente indígenas, sob a avaliação do ponto de vista, em tese, preconceituoso do olhar do não índio. 1 Art. 55. Quando o declarante não indicar o nome completo, o oficial lançará adiante do prenome escolhido o nome do pai, e na falta, o da mãe, se forem conhecidos e não o impedir a condição de ilegitimidade, salvo reconhecimento no ato. Parágrafo único. Os oficiais do registro civil não registrarão prenomes suscetíveis de expor ao ridículo os seus portadores. Quando os pais não se conformarem com a recusa do oficial, este submeterá por escrito o caso, independente da cobrança de quaisquer emolumentos, à decisão do Juiz competente.

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