Direito em Movimento - Volume 18 - Número 1 - 1º semestre/2020
56 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 18 - n. 1, p. 51-77, 1º sem. 2020 ARTIGOS a importância da documentação básica para a vida moderna e, principal- mente, aclarando o fato de que eles não deixam de ser indígenas ao adqui- rirem documentos de “branco”. Durante o período de divulgação do programa nas comunidades in- dígenas mais isoladas, percebeu-se que essa era a questão mais recorrente e sensível apresentada pelos “tuxauas” das tribos visitadas pela Justiça Iti- nerante. Nesse aspecto, o senso de pertencimento à comunidade repelia a ideia de qualquer registro que pudesse ameaçar essa condição. É importante que se diga, em homenagem ao devido respeito cultural, que nada deve ser compulsório ou revestido de subterfúgios que manipulem a vontade livre e consciente do indivíduo. A escolha é deles, a respeito de como e quando serão atendidos para a obtenção do registro civil. Isso significa que as ações de cidadania devem ser executadas em comum acordo com as comu- nidades tribais, segundo o calendário por eles sugerido, que levará em conta os períodos reservados para a roça, caça e festas religiosas e culturais. Ao cunhar tais “deferências”, não se deve imaginar que o Estado bra- sileiro estaria criando um tratamento diferenciado entre nacionais, a ferir o princípio da igualdade, previsto no art. 5.º, caput , da Constituição Federal, como ensina Edilson Vitorelli Diniz Lima: No que tange à aplicação das leis brasileiras aos índios, as leis do Estado brasileiro são cogentes e aplicáveis a todos os bra- sileiros de forma igual, contudo, considerando as diferenças existentes entre os indivíduos, ou até mesmo entre as coleti- vidades, é reconhecido o princípio constitucional da isonomia ou igualdade material, que permite tratar os desiguais, de for- ma desigual, na medida em que igualem. Nesses termos, conforme o parágrafo único do art. 1.º do Es- tatuto do Índio, todas as leis do país são aplicáveis aos índios e comunidades indígenas da mesma forma que são aplicadas aos demais brasileiros, desde que sejam compatíveis com os usos, costumes e tradições indígenas (LIMA, 2011, p. 21).
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz