Direito em Movimento - Volume 18 - Número 1 - 1º semestre/2020
38 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 18 - n. 1, p. 28-50, 1º sem. 2020 ARTIGOS se reflete nos obstáculos para a socialização normalizadora da população, os quais trazem consigo uma troca de modelos institucionais de controle social cuja forma mais explícita e contemporânea é a polícia. Toda essa esquizofrenia estrutural se reflete nas práticas policiais que rejeitam a ideia de igualdade formal e pontuam que a aplicação de um tratamento desigual é cabível, tendo em vista as desigualdades das pessoas, na medida em que estas se desigualam. Dessa forma, as práticas policiais revelam a reprodução de uma hierarquia que se apresenta desde a formação do nosso Judiciário. Sendo assim, o caso concreto, objeto desta discussão, apresenta como pano de fundo uma esquizofrenia do sistema de justiça criminal, o que ocasiona uma prática policial baseada na “cri- minalização da pobreza”, associada a uma lógica policial e a uma disputa de campo de poder. Esta hierarquia não é funcional, mas em relação ao conte- údo do trabalho, uma vez que os Procuradores não apenas avaliam a atuação dos policiais, mas também modificam o significado do que é apresentado pelos policiais. Porém, esta desconfiança institucionalizada não se apresenta na forma de identificação da responsabilidade dos diferentes atores. Ne- nhuma responsabilidade dos policiais é apurada em caso de uma interpretação diferente dos fatos, assim como o próprio entendimento dos Procuradores não é colocado em questão nestes casos. (GERALDO, BRAÇANTE, 2017, p. 173) A ruptura da lógica policial, que causou o estranhamento, no caso concreto, corrobora com o campo de disputa que atinge não somente poli- ciais e promotores de Justiça, mas todas as instituições envolvidas na admi- nistração de conflitos, quando estas concorrem na administração simbólica do direito (GERALDO, BRAÇANTE, 2017). Sem esquecer que o direito lesado que deu origem a todo o caso policial complexo – a cliente que pa- gou por uma coisa e recebeu outra – continuou sem ser administrado. Ao denunciar o traficante para os PMs que patrulhavam a rua, não temos se- quer como afirmar com certeza se objetivo da cliente era reparação, dinhei-
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