Direito em Movimento - Volume 18 - Número 1 - 1º semestre/2020
34 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 18 - n. 1, p. 28-50, 1º sem. 2020 ARTIGOS Enquanto a primeira tem uma aplicabilidade particularizada (e prática), a segunda é geral (e abstrata). Essa aplicação particularizada da lei, exemplifi- cada nas práticas do cotidiano policial, contribui para uma falta de protoco- lo que faz com que, em situações com alguma similaridade, procedimentos distintos sejam utilizados. O historiador Marcos Bretas (1997) chama a atenção para outro mo- mento. No início do século XX, segundo os discursos tornados públicos, o trabalho dos policiais estaria associado a uma ideia de disciplinarização da sociedade, que postulava entrar definitivamente na modernidade. Contu- do, a sociedade ideal – desejada pelos políticos naquele início da história republicana do país – excluía grande parte da população real, ao passo que privilegiava outros poucos segmentos. Nesse cenário, a ação da Polícia Mi- litar, que completa nesse período o primeiro centenário, mais uma vez tem seu emprego estruturado mais em torno dos interesses do Estado do que da sociedade, objetivando “disciplinar”, à sua maneira, as tensões decorrentes desse projeto “civilizatório”, que interessava às classes dominantes. Nos dias de hoje, cabe à Polícia Militar a execução do policiamento ostensivo e a manutenção da ordem pública, e os policiais são os operado- res que selecionam os sujeitos que ingressarão ou não no sistema criminal. Munidos de discricionariedade e Poder de Polícia, eles decidem ou não pela abordagem fundamentada na necessidade de controlar e conhecer as pessoas (COSTA, 2018). Cabe aqui apontar que o Poder de Polícia possui três atributos: discricionariedade, autoexecutoriedade e coercibili- dade. Para fins de análise deste trabalho, chama atenção o primeiro deles. Em termos práticos, a discricionariedade é traduzida na livre escolha pela administração pública da oportunidade e conveniência para exercício do Poder de Polícia, bem como no apoio às sanções e emprego dos meios necessários para que seja atingido o objetivo desejado, resumido na pro- teção de um interesse público específico (DI PIETRO, 2007; MELLO, 2008). Entretanto, tal conceito revela-se como dogmático e inadequado para explicar as práticas policiais.
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