Direito em Movimento - Volume 18 - Número 1 - 1º semestre/2020

33 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 18 - n. 1, p. 28-50, 1º sem. 2020 ARTIGOS o que acontece quando essa lógica é de alguma maneira quebrada? Que estruturas e lógicas o espanto com a excentricidade expõe? Para a apresentação deste trabalho, utilizaremos como metodologia a observação participante, a partir da observação das práticas policiais, o que permite interlocuções e interações. “O observador participante coleta dados através de sua participação na vida cotidiana do grupo ou organização que estuda” (BECKER, 1993, p.14). 2. A história das Polícias no Brasil e no Rio de Janeiro A instituição policial, segundo Thomas Holloway, em “Polícia no Rio de Janeiro: repressão e resistência numa cidade do século XIX” , é uma das ins- tituições fundamentais do mundo moderno, através da qual o poder do Estado se assenhorou do espaço público para controlar e dirigir o com- portamento dos sujeitos (HOLLOWAY: 1997). Sendo assim, tal entidade se conecta a novos ideais de sociedade e direitos, avessos a privilégios do chamado Antigo Regime, na transformação estrutural da sociedade que obteve como resultado a substituição dos antigos súditos por modernos cidadãos. No caso brasileiro, notadamente no Rio de Janeiro, que foi for- malmente sede de corte, de 1808 a 1889, primeiro, de um reino absolutista (até 1822), depois, de um Império na periferia do mundo, a formação das forças policiais seguiu outros imperativos que não os da modernidade euro- peia. O próprio trabalho historiográfico de Holloway é um estudo em torno da especificidade das forças policiais do Rio de Janeiro em seu nascedouro. O serviço policial militar do estado do Rio de Janeiro é caracterizado, em alguma medida, pela imprevisibilidade e, em grande parte, pela aplica- ção particularizada da lei, além do respeito a uma “ética corporativa”. A lei é atualizada pelos operadores indo ao encontro de práticas que representam as éticas corporativas, ou seja, uma ética implícita, como aponta o antro- pólogo Roberto Kant de Lima (2007), cuja força de adesão é intensa. Des- respeitar essa ética corporativa não possui o mesmo peso que desrespeitar a lei, tendo a primeira (ética corporativa) precedência sobre a segunda (lei).

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