Direito em Movimento - Volume 18 - Número 1 - 1º semestre/2020
124 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 18 - n. 1, p. 111-128, 1º sem. 2020 ARTIGOS Trindade. O édito expressava o desejo do imperador de que todos seguis- sem a religião de São Pedro, conforme defendida em Roma por Damásio e em Alexandria por Pedro (sucessor de Atanásio, falecido em 373). Seus seguidores passariam assim a se chamar de “católicos” (primeira vez que o termo é empregado num texto legal), e os que professassem crença diversa eram proscritos. A fé nicena distinguia claramente Teodósio de Valente, a cujo arianismo se atribuía a derrota de Adrianopla. No ano seguinte Teodósio foi mais adiante. Publicou uma constituição definindo como heréticos os focinianos, arianos e eunomianos. Proibia-os ainda de se reunirem, confiscava suas igrejas, transferindo-as aos nicenos, e os expulsava. Dita lei, aliás, definia como “herético” quem não seguisse o credo niceno. A concepção nicena da Santíssima Trindade, por conseguin- te, se firmava como lei. Teodósio convocou, então, um novo concílio ecumênico (o segundo da cristandade) para sacramentar a situação, reunido em Constantinopla, em 381. Trata-se da afirmação de unidade da Igreja no credo niceno; o que antes era um debate teológico, agora virou cânone ecumênico. A consubs- tancialidade das três pessoas da Santíssima Trindade assumia status jurídico. O Espírito Santo também foi expressamente contemplado, condenando-se igualmente como heréticos os macedonianos, ou seja, aqueles que negavam a natureza divina da terceira pessoa da Santíssima Trindade 40 . O Império passava, portanto, a ter uma única religião oficial: o catoli- cismo, isto é, o cristianismo segundo o credo de Nicéia. As legiões imperiais logo se prontificaram a extinguir os últimos redutos arianos. Daí em diante, ser romano passou a significar ser cristão, e Estado e Igreja passaram a ca- minhar lado a lado. O arianismo, de fato, caiu gradativamente em desuso no Império, mas a crença, entretanto, iria ainda sobreviver durante alguns séculos entre os povos germânicos. 40 Vale transcrever aqui a Oração 31 de Gregório de Nazianzeno, em defesa da divindade do Espírito Santo: “ Vejam esses fatos: Cristo nasce, o Espírito Santo é seu precursor. Cristo é batizado, o Espírito Santo testemu- nha... Cristo realiza milagres, o Espírito Santo os acompanha. Cristo ascende, o Espírito Santo toma Seu lugar. Que grandes coisas existem na ideia de Deus que não estão em Seu poder? Que títulos pertinentes a Deus não se aplicam também a Ele, exceto por “Não-criado” e “Criado”? Eu tremo quando penso em tal abundância de títulos, e quantos nomes eles blasfemam, estes que se revoltam contra o Espírito! ”.
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