Direito em Movimento - Volume 17 - Número 2 - 2º semestre/2019

47 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 17 - n. 2, p. 34-51, 2º sem. 2019 ARTIGOS Fixemos, por exemplo, pela sua preponderância, o tema da responsabilidade penal, baseada, de jure constituto, na res- ponsabilidade moral, que, por sua vez, assenta no postulado da vontade livre. É pela porta deste tema que se entra no âmbito da ciência penal. Houve um tempo em que o liberti- nismo da vontade humana foi colocado num mostruário de museu, entre a vértebra de um megatério e uma múmia egíp- cia; mas foi lá buscá-lo, de novo, a teoria do conhecimento, a confirmar, uma vez mais, a doutrina dos retrocessos de Vico. A ciência, a serviço da filosofia materialista, apregoara o cau- salismo universal, a que não podia forrar-se a psique humana, e negara, a pés juntos, a liberdade volitiva do homo erectus et sapiens. A demonstração, porém, firmava-se numa simples e sumária dedução generalizadora, e pode Bergson, um dos maiores cérebros da era contemporânea, fazendo a intuição suprir o limitado alcance da inteligência, formular a sua in- terrogação: se o movimento molecular pode criar sensação com um nada de consciência, por que a consciência não pode criar, por sua vez, movimento, seja com um nada de energia cinética e potencial, seja utilizando essa energia a seu modo? (HUNGRIA, 1942b, p. 8). O que fica evidente nessa defesa de Hungria é que a vontade não po- deria ser descartada – tal como seria pelos defensores da escola positivista – como elemento a ser pensado para entender o que leva uma pessoa a um ato criminoso. Em outras palavras, as certezas que o pensamento científico dizia produzir foram por ele questionadas. Desse modo, se levarmos em consideração as próprias descobertas da ciência naquela primeira metade do século XX, essas certezas estavam sendo desconstruídas, tendo em vista a descoberta da Teoria da Relatividade por Albert Einstein. Mais uma vez, Hungria fez referência a esse momento para justificar os cuidados que o jurista deveria ter em relação a um cientificismo que mal havia consegui- do colocar a “luz na imensa noite da ignorância humana”, e já colocava

RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz