Direito em Movimento - Volume 17 - Número 1 - 1º semestre/2019

28 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 17 - n. 1, p. 15-31, 1º sem. 2019 ARTIGOS os deveres e custos profissionais que decorrem do problema primitivo, em princípio aufere um lucro extra e injustificado, portanto antijurídico. Nos casos em que megaempresas capitalistas ainda se aproveitam, de má-fé, da sua supremacia no mercado para submeter uma coletividade de consumidores ao modus solvendi dos problemas de consumo que elas pró- prias criam, tanto os danos indenizáveis sofridos individualmente pelo con- sumidor, quanto o enriquecimento injustificado alcançado de modo antiju- rídico pelo fornecedor, resultam, em última análise, da exploração abusiva do tempo vital da pessoa vulnerável pelo sujeito em posição de vantagem na relação de consumo. 28 A denominação do novo instituto jurídico como “responsabilidade civil pela perda do tempo livre ou útil” mostra-se inadequada e incomple- ta. Inadequada porque, na vida agitada e ocupada de hoje, “tempo livre” traduz a ideia mais restrita do “tempo que sobra” depois que se realizam as atividades necessárias ou preferidas, ao passo que “tempo útil” pode car- regar a ideia enganosa de que existe algum “tempo inútil” à vida humana. Incompleta porque, ao ocasionar um evento de desvio produtivo, o forne- cedor torna-se responsável não só pelo prejuízo do tempo (bem jurídico) desperdiçado pelo consumidor, como também pela alteração danosa das suas atividades planejadas ou desejadas (interesses jurídicos) – ou seja, pela alteração danosa da sua vida. Portanto, classifico esse tempo pessoal do consumidor de “tempo vital, existencial ou produtivo”, enquanto designo o novo instituto em apreço de “Responsabilidade Civil por Desvio Produtivo do Consumidor”. 29 Mediante a ressalva de que os profissionais liberais respondem sub- jetivamente pelo fato do serviço, nos termos do art. 14, § 4º, do CDC, os 28 Nesse sentido, Marx sustenta que, na nascente sociedade industrial, o lucro originava-se da exploração do tempo de trabalho dos trabalhadores assalariados pelos empresários capitalistas, conforme sua Teoria da Mais-valia (MARX, 1996, livro I, tomo 2, p. 138). Hodiernamente constato que, na sociedade de massas pós- -industrial, a exploração abusiva do tempo vital dos consumidores vulneráveis é uma das novas formas de lucro de megafornecedores capitalistas. 29 Veja DESSAUNE, 2017, item 9.4 e capítulo 16.

RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz