Direito em Movimento - Volume 17 - Número 1 - 1º semestre/2019

26 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 17 - n. 1, p. 15-31, 1º sem. 2019 ARTIGOS de desvio produtivo traz como resultado para o consumidor, acima de tudo, um dano existencial. 22 Esse prejuízo extrapatrimonial ocorre como consequência de dois fenômenos imutáveis: o tempo é um recurso produtivo limitado que não pode ser acumulado nem recuperado ao longo da vida das pessoas; 23 e nin- guém pode realizar, simultaneamente, duas ou mais atividades de natureza incompatível ou fisicamente excludentes, do que resulta que uma atividade preterida no presente, em regra, só poderá ser realizada no futuro supri- mindo-se outra atividade. 24 Ou seja, o dano em questão resulta da lesão ao tempo vital do consumidor que, enquanto bem econômico escasso e inacumulável, nessa situação sofre um desperdício irrecuperável; do mesmo modo, tal dano decorre da lesão a qualquer atividade planejada ou desejada do consumidor que, enquanto interesse existencial suscetível de prejuízo quando deslocado no tempo, nessas circunstâncias sofre uma alteração da- nosa inevitável. Por outro ângulo, considerando-se que “o verdadeiro detentor do po- der é aquele que está em condições de impor aos demais o seu ritmo, a sua dinâmica, a sua própria temporalidade” e que “a pena é tempo e o tempo é pena[, isto é, que] pune-se através da quantidade de tempo e permite- se que o tempo substitua a pena”, 25 pode-se dizer que o fornecedor, ao se encontrar em posição de vantagem para impor ao consumidor vulnerável o próprio modus solvendi do problema de consumo que criou, tem o poder de transformar em pena (“castigo”) o tempo que o consumidor precisa gastar 22 Dano existencial é a lesão a qualquer atividade existencial humana, que precisa ser modificada ou suprimida em decorrência de uma interferência externa injustificada na liberdade de ação da pessoa, resultando em uma alteração danosa do seu modo de ser, do seu cotidiano e/ou do seu projeto de vida (DESSAUNE, 2017, p. 356-357). 23 Veja DESSAUNE, 2017, itens 9.2 e 9.3. 24 Veja DESSAUNE, 2017, item 12.1. 25 LOPES JR., 2009, p. 142-143.

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