Direito em Movimento - Volume 17 - Número 1 - 1º semestre/2019
115 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 17 - n. 1, p. 90-141, 1º sem. 2019 ARTIGOS comunidade. Não são raras as vezes em que perguntam se podem “pagar a cesta básica” ou se realmente precisam estar em casa às 22 horas. Pari passu , quando as condições fixadas para a concessão da prisão albergue domiciliar são lidas, os apenados que desejam desesperadamente “ir para casa”, falam que “assinariam qualquer coisa”. Tal fato levou ao questionamento acerca do aspecto subjetivo da necessidade de aceitação das condições da concessão do benefício, face à posição nada favorável do apenado. Naquele, ele assinaria até um documento em branco “em troca de sua liberdade”, no sursis , “passa demoradamente” a caneta sobre o papel, como se ele próprio pudesse alterar aquelas cláusulas, de forma que seu suplício seja o mais brando possível. E é exatamente essa consciência de que “o crime não compensa” e de que “já se pagou o que era devido” que o Estado obtém do egresso do siste- ma prisional, a contrapartida esperada, tornando desnecessária a utilização da tornozeleira eletrônica. Este estudo baseia sua pesquisa em dados reais, colhidos no estado do Rio de Janeiro, no período de 2014 a 2016. Entrevistando os egressos que se encontram em prisão albergue domiciliar, verificou-se que a utilização da tornozeleira eletrônica torna-se insipiente e, ao invés de ajudar na res- socialização tão necessária, causa estigma, preconceito, discriminação, num momento em que todos os esforços devem ser envidados para recolocar o egresso no mercado de trabalho. E, mais uma vez, afirma-se que a avaliação sobre a real necessidade do monitoramento eletrônico deve ser feita também através da análise socio- cultural do povo brasileiro, pois, nos Estados Unidos, Espanha e Portugal, não foi percebido o mesmo grau de reprovabilidade que o aqui encontrado, talvez porque nos Estados Unidos o monitoramento eletrônico seja feito em imigrantes que estão no país de forma irregular, em autores de crimes de trânsito e em demais crimes de baixo potencial ofensivo, o que faz com que o uso da tornozeleira não apresente esse aspecto tão discriminatório.
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz