Direito em Movimento - Volume 16 - Número 2 - 2º semestre/2018
198 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 16 - n. 2, p. 182-202, 2º sem. 2018 ARTIGOS Trinta anos foram necessários para que se compreendesse que a eman- cipação da Administração Pública da legalidade estrita reducionista para a ju- ridicidade reverente à Constituição 22 estaria a exigir uma reaproximação do exercício de aplicação das normas de direito público.Antes tarde do que nunca! No tema específico da judicialização de políticas públicas, o primeiro apontamento que é de se fazer diz respeito ao explícito reconhecimento pela Lei 13.655/18, em seu art. 22, da necessidade de se ter em conta as exigências que delas decorram quando se cogita da delimitação de sentido às normas de direito público. Duas consequências são de se extrair dessa afirmação. A primeira delas diz respeito à reiteração da exigibilidade de formulação de políticas públicas como leito para a veiculação do programa de ação estatal. Não se tem aqui, a rigor, qualquer substantiva inovação no arcabouço jurídico aplicável à matéria, eis que essa mesma conclusão já se extrairia do texto constitucional. 23 De toda forma, e agora com a referência explícita ao instrumento das políticas públicas, tem-se a norma – elemento tão caro à cultura jurídica brasileira. A segunda consequência diz respeito à necessidade de análise das re- lações de interferência recíproca entre o sentido que se confere à lei no momento da interpretação e políticas públicas que se tenha em curso. Este é comando mais inovador, e o ponto sensível estará na consolidação de uma leitura de sua aplicabilidade em relação não só à Administração Pública, mas também e em especial, ao controlador e ao Judiciário. Isso porque se é possível presumir a existência de um ponderável grau de coerência interna entre interpretação das normas e políticas públicas no âmbito da Adminis- 22 É de Sundfeld o apontamento da ainda persistência da lógica monista, da Administração como mera exe- cutora de leis, não obstante a insuficiência deste modelo e sua inadaptação às propostas transformadoras da Carta de Outubro. As vertentes explicativas apresentadas pelo autor compreendem uma instrumentalidade à resistência no período ditatorial, e ainda uma cultura de identificação do Legislativo como o espaço único para o exercício da deliberação pública (SUNDFELD, Carlos Ari. Direito administrativo para céticos . 2ª edição, rev. e ampliada, São Paulo: Malheiros, 2014, 351 p.). 23 Na matéria, consulte-se VALLE, Vanice Regina Lírio do Valle. Dever constitucional de enunciação de políticas públicas e autovinculação: caminhos possíveis de controle jurisdicional. Fórum Administrativo , v. 82, p. 7-19, 2007; e VALLE, Vanice Regina Lírio do Valle. Políticas públicas, direitos fundamentais e controle judicial . 2ª. ed. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2016, 194 p.
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz