Direito em Movimento - Volume 16 - Número 2 - 2º semestre/2018

195 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 16 - n. 2, p. 182-202, 2º sem. 2018 ARTIGOS tem-se a explicitação da possibilidade do manejo da ação civil pública pelo Parquet para fins de proteção individual ao direito à saúde, tido como direi- to individual indisponível – o que pode contribuir para o agravamento da tendência acima indicada da disseminação de demandas singulares. O risco é o aprofundamento da busca da jurisdição não para o controle de política pública no verdadeiro sentido da palavra, mas para a tutela da projeção na esfera individual de direitos, dos programas de ação estatal em curso. Isso é a negação dos objetivos que inspiram, a um só tempo, seja a lógica da formulação de políticas públicas, seja a criação da figura da ação coletiva. A par da contradição teórica que esse desvio de percurso do encontro entre políticas públicas e ações coletiva proporciona, é de se destacar ainda a oportunidade para uma indesejável seletividade no que toca às pautas de controle – seja no que diz respeito ao tema controlado, seja no que alude à matriz sindicante a se aplicar (individual ou coletiva). A possibilidade do uso indistinto de qualquer das aproximações controladoras implica, do ponto de vista concreto, assegurar a este agente uma discricionariedade que a rigor não deflui do sistema constitucional. Em nenhum ponto se tem no Texto Fundamental uma preferência pela proteção individual em detrimento da tutela coletiva, estruturante. Ao revés, a leitura dos objetivos fundamentais da República aponta, em especial na alusão a uma sociedade justa e solidária, para a dimensão do todo como preferencial – ainda que disso não deflua a possibilidade da desconsideração das necessidades individuais. 17 Cumpre ainda assinalar que esse (patológico) deslocamento da discri- cionariedade em favor do agente controlador completa-se com uma aber- tura que também não se revela argumentativamente sustentada, no que toca à formulação do pedido. Assim, apresenta-se na demanda que pretende o controle judicial de políticas públicas, ou o pedido de nulificação, ou ainda o de interrupção da iniciativa em curso – sem que se tenha a proposição da estratégica de ação que deva tomar lugar daquela censurada. 17 VALLE, Vanice Regina Lírio do. Controle judicial de políticas públicas: sobre os riscos da vitória da semântica sobre o normativo. Revista Direitos Fundamentais & Democracia 14, no. 14.2 (2013): 387.

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