Direito em Movimento - Volume 16 - Número 2 - 2º semestre/2018

167 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 16 - n. 2, p. 149-181, 2º sem. 2018 ARTIGOS determinismo geográfico de Thomas Buckle (1821-1862) nas suas análises literárias e cultural-etnológicas. Portanto, devido à sua apropriação parti- cular do evolucionismo de Haeckel, em chave determinista-positivista, Ro- mero absorveu também os pressupostos do racismo científico presentes no debate europeu de então, que consideravam a “raça” branca como superior. Por outro lado, Romero conferiu destaque em seus estudos à “mestiçagem” cultural e racial, retomando uma ideia lançada pelos viajantes europeus, em especial por Martius 57 , de que a particularidade da identidade brasileira residia na mestiçagem da população. 58 Ao ver a “mestiçagem” como algo positivo, Romero lançou as bases para os estudos culturais e etnológicos afro-brasileiros e para a valorização das tradições folclóricas e populares. 59 Por meio de sua recepção do evolucionismo haeckeliano, formulou os pres- supostos para uma “teoria do branqueamento”, marca do racismo brasilei- ro. 60 Esta teoria, ou “ideologia”, daria suporte às políticas eugênicas oficiais de incentivo à imigração europeia nas primeiras décadas do século XX no Brasil. 61 A ideia romeriana da particularidade brasileira como “cultura mes- 57 O texto de Martius “Como se deve escrever a história do Brasil”, publicado em francês na revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro em 1845 – e até hoje sem tradução para o português – foi resultado de um concurso público aberto pelo Instituto e muito influenciou os intelectuais da época, em especial Sílvio Romero e Francisco Adolfo de Varnhagen (1816-1878). O crítico literário Roberto Ventura (1957-2011) esclarece que: “Martius estabeleceu as linhas de um projeto historiográfico, capaz de garantir uma identidade específica à nação em processo de construção, ao gerar o mito da democracia racial. Cabe ao historiador revelar a missão reservada ao país: realizar a mescla de raças, sob a tutela do Estado. Ao mesmo tempo, atribuiu ao elemento branco um papel civilizador, que assegurava o predomínio político e cultural da coroa e dos grupos letrados. Esse projeto sincrético foi levado à frente por Francisco Adolfo de Varnhagen (…) e por Sílvio Romero (…). Ambos abraçaram a idéia da ‘nação’ como unidade racial e cultural, resultante do cruzamento das três raças, rumo ao progressivo branqueamento”. VENTURA, Roberto. Estilo tropical: história cultural e polêmicas literárias no Brasil, 1870-1914 . São Paulo: Companhia das Letras, 1991, p. 42. 58 Ver CANDIDO, Antonio. O método crítico de Sílvio Romero . Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul, 2006 e VEN- TURA, Op. cit. 59 Ver ROMERO, Sílvio. Estudos sobre a Poesia Popular do Brasil . 2 a . ed. Petrópolis: Editora Vozes, 1977. 60 HOFBAUER, Andreas. “O conceito de ‘raça’ e o ideário do ‘branqueamento’ no século XIX – Bases ideológi- cas do racismo brasileiro”. In: Teoria e Pesquisa , 42 e 43, janeiro-julho de 2003, p. 63-110. 61 Sobre as políticas eugenistas e o racismo no Brasil, ver KERN, Gustavo da Silva. “Teorizações eugenistas no Brasil: melhoramento racial, eugenia e educação”. In: X ANPED SUL , Florianópolis, outubro de 2014, 16p. Disponível em: http://xanpedsul.faed.udesc.br/arq_pdf/1939-0.pdf. Acesso em: 21 mar. 2018.

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