Direito em Movimento - Volume 16 - Número 2 - 2º semestre/2018
110 Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 16 - n. 2, p. 106-136, 2º sem. 2018 ARTIGOS O desenvolvimento dos estudos histórico-jurídicos em Portugal ga- nha fôlego com a corrente iluminista, que tem uma espécie de prólogo na obra de Luís António Verney. Neste ponto, dois fatos devem ser destacados. Primeiramente, a lei de 18 de agosto de 1769, chamada Lei da Boa Razão; em segundo lugar, destaque deve ser dado à reforma dos Estatutos da Fa- culdade de Direito de Coimbra (1772). A Lei da Boa Razão marca a ruptura que introduz em Portugal as preocupações com o racionalismo. No “Século das Luzes”, essa lei mantém a vontade do monarca, tal qual assentado nas Ordenações Filipinas, que indicam a vontade do rei (da vontade do rei se deduzia diretamente a lei, e, em certa medida, o estilo da corte e o costume), mas pretende-se substituir o “ ultrumque ius ” - também assentado nas Ordenações (considerando aí incorporadas as “opiniões de Acúrsio e Bártholo e a “ communis opinio ”), ou seja, refugaram-se as Leis Romanas que “ em boa razão não forem fundadas ”. Rei e Razão, este o espírito da Lei de 1769, que foi apelidada como “Lei da Boa Razão”, pela frequente recorrência à boa razão , inscrita em seu texto. As fontes do direito português passam, a partir de então, a serem con- sultadas uma vez que o recurso aos pareceres dos glosadores não é mais invocado, e tomam-se medidas relativas ao estilo da corte e ao costume. Quanto ao estilo da corte, determina-se que o estilo só seria válido desde que tivesse sido aprovado pelo Assento da Casa da Suplicação ; e, quanto ao costume, estabelece-se que ele só seria fonte de direito, desde que concor- ressem três requisitos: “ser conforme à boa razão, não ser ‘contra legem’ e ter mais de cem anos 5 . Como pode ser observado, estabelecia-se, de um modo geral, que o direito romano só deveria ser utilizado quando em conformi- dade com a boa razão ; esta estaria, portanto, passível de contraposição ao direito romano e ao direito canônico. Em relação ao direito canônico, a reforma iluminista vai tecer con- siderações restritivas. A Lei de 1769 aponta o “ erro manifesto ” de se supor 5 Lei da Boa Razão, § 14, Ordenações Filipinas , Livro III, Fundação Calouste Gulbenkian, edição organizada por Cândido Mendes de Almeida-1870/Rio de Janeiro, Lisboa, 1985.
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