Relatórios de Pesquisa Nupegre | Número 4

24 Relat. Pesq. NUPEGRE, Rio de Janeiro, n. 4, 2019. historicamente mecanismos de patologização e marginalização de determinadas identidades. Sob essa perspectiva, temos no binômio Medicina-Direito saberes oficias que atuam conjuntamente com outros mecanismos como práticas reguladoras para estabelecer essa ordem compulsória de sexo/gênero/desejo. Ao tratar do paradigma médico-científico, Ventura afirma que o tratamento patologizante da transexualidade é incorporado na lingua- gem bioética e jurídica, que define o desejo de ser do sexo oposto ao seu como um tipo de transtorno psíquico. Para a autora, há duas restri- ções para a mudança de sexo: a primeira é de natureza deontológica/ clínica, que regula o acesso à terapia de mudança de sexo conforme um protocolo de averiguação da presença de um transtorno psicoló- gico atestado por um laudo médico; já a segunda, de natureza legal, regula o acesso à identidade sexual civil, que é definida pela anatomia sexual no momento do nascimento 37 . De uma perspectiva da Bioética, Ventura questiona: é moralmente legítima a tutela psiquiátrica, a medicalização e a judicialização de uma condição sexual para o acesso a direitos de cidadania garantidos em uma sociedade democrática para todos os indivíduos indistintamente? 38 É na articulação do discurso médico com o discurso jurídico que buscamos a compreensão de como a transexualidade é compreendida pelo Poder Judiciário. Quando analisado o teor das decisões, percebemos que as nega- tivas para alteração do registro civil, especialmente no que diz respeito à alteração do sexo, eram construídas a partir de argumentos que ape- lavam para a existência de uma “verdade biológica”, que só poderia ser superada pela cirurgia. Na maior parte dos casos, a alteração do nome era permitida – quase sempre condicionada à presença de um laudo médico que atestasse o “transexualismo”. Em muitos casos, o laudo psicológico, além de ser exigido, é determinante para a formação do entendimento do/a magistrado/a por 37 VENTURA, M. A Transexualidade no Tribunal: Saúde e Cidadania. Rio de Janeiro: UERJ, 2010 38 Ibdem.

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