Relatórios de Pesquisa Nupegre | Número 4
22 Relat. Pesq. NUPEGRE, Rio de Janeiro, n. 4, 2019. saber-poder. O discurso médico-científico aliado ao sistema de justiça, historicamente, controlou esse acesso e regulou as normas de gênero e desejo (cisnormatividade e heterossexualidade). A complementaridade natural seria a prova inquestionável de que a humanidade é necessariamente heterossexual e que os gêneros só têm sentido quando relacionados às ca- pacidades inerentes de casa sexo. Através das performan- ces de gênero, a sociedade controla as possíveis sexualida- des desviantes. Será a heterossexualidade que justificará a necessidade de se alimentar/produzir cotidianamente os gêneros binários, em processo de retroalimentação. Os gêneros inteligíveis estão relacionados à heterossexualida- de e esta precisa da complementaridade dos gêneros para justificar-se enquanto norma. Há uma amarração, uma cos- tura, no sentido de que o corpo reflete o sexo, e o gênero só pode ser entendido, só adquire vida, quando referido a essa relação. As performatividades de gênero que se arti- culam fora dessa amarração são postas às margens, ana- lisadas como identidades transtornadas, anormais psicóti- cas, aberrações da natureza, coisas esquisitas. A repetição permite a eficiência dos atos performativos que sustentam e reforçam as identidades hegemônicas, mas também são as repetições deslocadas do contexto natural dos sexos, a exemplo da transexualidade, que possibilitam a emergên- cia de práticas que interrompam a reprodução das normas de gênero, e ao fazê-lo, explicitam o caráter excludente da categoria “humano” das pessoas que reconstroem suas posições identitárias, transitando e, portanto, negando a precedência explicativa do biológico. 33 33 BENTO, Op. Cit., p. 44-45
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