Relatórios de Pesquisa Nupegre | Número 4
13 Relat. Pesq. NUPEGRE, Rio de Janeiro, n. 4, 2019. Como diversas teorias críticas do Direito (especialmente as fe- ministas) apontaram nas últimas décadas, o Direito não é universal, neutro e objetivo. 12 A linguagem jurídica não descreve uma realidade ou apresenta uma verdade de forma técnica e neutra. Para Butler, as práticas jurídicas produzem os sujeitos que elas alegam representar, sendo, portanto, um dos mecanismos de legitimação e exclusão: “a lei produz depois oculta a noção de ‘sujeito perante a lei’, de modo a invo- car essa formação natural que legitima, subsequentemente, a própria hegemonia reguladora da lei” 13 . Alicia Ruiz afirma que a realidade social são construções contin- gentes e relativas nas quais o Direito também intervém. 14 O discurso jurídico é então uma das formas de produção/repressão da categoria “mulheres”, exercendo um controle moral sobre os signos da feminili- dade: “O Direito participa na configuração do estereótipo de ‘mulher’, e é a partir desse estereótipo que as normas jurídicas reconhecem ou negam ‘direitos’ a mulheres de carne e osso” 15 . Uma abordagem puramente dogmática se demonstra insuficiente para compreensão da participação do Direito como uma das práticas sociais regulatórias de identidades. Por esses motivos, adotamos uma abordagem a partir da Filosofia do Direito para tentar compreender quais argumentos utilizados pelos/as magistrados/as são mobilizados para permitir ou negar direitos a pessoas transexuais e transgêneras. Ao analisar o processo de decisão, Araujo afirma que “as decisões não são tomadas em virtude da fixação de um texto de base, mas na atribuição de um sentido a esse texto, num processo interpretativo em que os valores e a sensibilidade do julgador desempenham um papel muito relevante”. 16 12 No âmbito da teoria feminista do direito, cfr., entre outras, SMART, Carol. La teoria feminista y el discurso juridi- co. In: El derecho en el genero y el genero en el derecho. Cedael. Editorial Biblos. Buenos Aires, Argentina. Sep- tiembre, 2000; OLSEN, Frances. El sexo del derecho. The Politics of Law (Nueva York, Pantheon, 1990), pp. 452-467. 13 BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Trad.: Renato Aguiar – 11ª Ed., Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2016. 14 RUIZ, Alicia. De las mujeres y el derecho. In: La identidad femenina y discurso del derecho/ Alicia E. C. Ruiz compiladora. -1ª Ed. – Buenos Aires: Biblos, 2000, p. 12. 15 Ibdem, p. 10. 16 ARAUJO, Alexandre. Curso de Filosofia do Direito. Disponível em: www.arcos.org.br/download. php?codigoArquivo=69 Acesso em: 07/08/2018.
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz