Relatório NUPEBIOS
17 Relat. Pesq. NUPEBIOS, Rio de Janeiro, nº 2, 2023. No dia em que Kelly foi realizar o procedimento, enquanto ainda aguardava na recepção, foi surpreendida pela chegada de policiais na clínica. Todos os presentes foram presos em flagrante delito, denunciados por infração ao art. 124, c/c art. 29, in fine , ambos do Código Penal. Os demais agentes foram denunciados por infração ao art. 126, caput (por três vezes), c/c art. 288 do Código Penal, na forma dos arts. 29 e 69, e art. 7º, IX, da Lei nº 8137/90. Consequências, no campo da bioética, da criminalização do aborto para mulheres no Rio de Janeiro A pesquisa demonstrou que a maior consequência bioética da criminalização do aborto consiste no óbito de mulheres que, independentemente das razões e circunstâncias, submetem-se ao procedimento de interrupção ilegal da gravidez. Essa afirmação é baseada nas evidências encontradas nos contatos dos pesquisadores do Núcleo com os autos dos processos judiciais sob análise. Percebemos que a ilegalidade do aborto não inibe a demanda pela interrupção voluntária da gravidez 7 , que, por sua vez, fomenta o surgimento e manutenção de inúmeros locais privados, dispersos geograficamente, que ofertam a realização clandestina dos procedimentos. A clandestinidade, decorrência direta da criminalização, normalmente está associada com a falta de condições de estrutura, de equipamentos e sanitárias ideais de grande parte das “clínicas”, algumas mais precárias do que as outras, fatores que potencializam a insegurança e o risco, são determinantes para o incremento do resultado morte e deságuam em situações particulares causadoras de perplexidade, como aquela que relatamos por intermédio do primeiro storytelling . Cada processo revelou uma história. Todas despertaram a atenção, mas certas descobertas impactaram mais do que as outras: realidades 7 Os resultados das “ondas” (edições publicadas em 2010, 2016 e 2021) da Pesquisa Nacional do Aborto corroboram tal constatação.
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