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Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro



Fórum Permanente de Mídia e Liberdade de Expressão discute assédio judicial


Fórum Permanente de Mídia e Liberdade de Expressão discute assédio judicial
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“O evento envolve um princípio que, para mim, é um dos mais importantes da democracia: a liberdade de expressão. Sem ela, não podemos sequer defender os valores e os princípios constitucionais mais importantes para todos nós. Mesmo aqueles que defendem outros princípios e os colocam acima dos demais não podem defendê-los se não tiverem voz e liberdade para se manifestar”, disse o diretor-geral da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ) e presidente do Fórum Permanente de Mídia e Liberdade de Expressão, desembargador André Andrade, na abertura do evento da última quarta-feira, dia 11.


Em sua 23ª reunião, o Fórum se propôs a debater e discutir “Assédio Judicial: uma ameaça à liberdade de expressão”. Participaram do webinar a advogada Taís Borja Gasparian; o escritor e cineasta João Paulo Cuenca; o jornalista Juca Kfouri; e a juíza e escritora Andréa Pachá.


Ainda na abertura, o desembargador André Andrade comentou: “Vivemos um momento difícil, no qual a sociedade anda muito polarizada e as pessoas parecem que perderam a capacidade de conversar e dialogar. Eu não diria que a liberdade de expressão não está sendo exercitada nos dias atuais; o que eu acho é que há muito abuso em relação a essa liberdade. No passado, o inimigo da liberdade de expressão era fácil de identificar, pois era o ditador de plantão, o Estado, aquele que buscava calar quem pensava diferente do regime. Hoje, a liberdade de expressão parece ter outros inimigos; grupos que, no passado, reivindicavam a liberdade para a defesa de determinados direitos. Vivemos uma Babel, em que, de um lado, invocamos a liberdade de expressão para as ideias que gostamos, mas, do outro lado, também queremos restringi-la daqueles que pensam diferente de nós”.


Em sua fala, a advogada Taís Borja citou casos de escritores, jornais e jornalistas que receberam processos por publicações. Ela chamou a atenção para alguns casos em particular.


“O caso da Elvira Lobato foi o mais emblemático porque foi tratado de uma maneira diferente. Ao contrário de outros casos, em que processos eram realizados a cada matéria produzida, o dela recebeu mais de 100 processos ao mesmo tempo por uma reportagem publicada. Era evidente que esse assédio tentava inibir ou até mesmo obstar a atividade jornalística e a liberdade de expressão. A Elvira se aposentou, deixou de ser repórter. Percebam o grau de intimidação que ela recebeu. Logo depois, o jornal “A Tarde”, da Bahia, também sofreu um assédio do mesmo tipo. Em 2016, no Paraná, o jornal “Gazeta do Povo” e mais cinco jornalistas também foram vítimas do mesmo assédio judicial”, comentou.


Com a palavra novamente, completando a fala da advogada, o diretor-geral da EMERJ e presidente do Fórum, desembargador André Andrade, comentou a respeito de processos no esporte, decorrentes da liberdade de expressão. O magistrado lembrou de movimentos na NFL e NBA, ligas de futebol americano e de basquete, respectivamente, dos Estados Unidos.


“Recentemente, ganhou as páginas dos jornais a notícia de que foi advertida a atleta do vôlei de praia Carol Solberg porque, depois de terminar uma partida e dar entrevista, pediu a saída do presidente. Ela foi processada no Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), onde advertiram a atleta, como dando uma lição de moral de que não se pode misturar política com esporte. Como não pode? Vemos essa discussão nos EUA com atletas de futebol americano e basquete, que se ajoelham durante o hino nacional, além de, recentemente, usarem camisetas com “Black Lives Matter”. Como é possível que hoje, em uma democracia, aceitem a ideia de que há espaços onde não se possa discutir política? Tudo é política. Até o fato de alguém se calar é política”, disse o magistrado.


Um caso citado pelos participantes do evento foi o do escritor João Cuenca, também presente no encontro. Em sua conta no Twitter, ele fez uma publicação que resultou em centenas de processos, lembrados por ele em sua fala. O palestrante abordou o assunto:


“Luto para que ninguém mais passe por isso. Mas, pior do que isso, é ver que escritores, jornalistas, pensadores e os cidadãos em geral têm medo de se expressar. Recebi muita solidariedade aqui no Brasil e na Alemanha após o post, mas ninguém republicou a frase. Algumas pessoas concordavam comigo, respondiam que eu tinha razão - e não vou pedir ou fazer campanha para as pessoas publicarem algo igual -, só que eu sentia o medo delas de se colocar. Essas que defenderam também viraram alvo na publicação. Foram achincalhadas nos comentários. Estamos vivendo sob o domínio do medo”.


O jornalista esportivo Juca Kfouri falou a respeito dos processos que recebeu por publicar matérias a respeito de ex-presidentes da Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Autor do livro “Confesso que perdi: memórias”, o jornalista discorreu sobre suas chamadas “derrotas”.


“Me perguntam como eu posso ter perdido, mas também há o outro lado. A verdade é que isso não me faz feliz. Eu queria que pessoas assim sumissem e no lugar delas fossem colocadas pessoas de bem, que mudassem a estrutura. Mas não, o sucessor será sempre o alvo das minhas próximas investigações. A derrota deles não me faz vencedor. Sei que é pretensioso dizer isto, mas eu não acredito em jornalista que não queira melhorar a esquina da rua onde mora, a cidade onde vive, o país onde nasceu. Com o perdão da pretensão, o mundo”, disse.


A juíza Andréa Pachá completou: “Também não acredito em juiz que não queira melhorar essas coisas. Por isso, fiz questão de estar presente no evento e de sempre estar próxima ao desembargador André Andrade, que busca, de forma incansável, trazer para o ambiente jurídico esse debate que é essencial”.


A transmissão completa do evento pode ser acessada pelo link: https://www.youtube.com/watch?v=7My1A2J9TN0&ab_channel=Emerjeventos



12 de novembro de 2020


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