Fechar

Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro



“Precisamos fazer valer os nossos direitos. Nossos filhos estão perdendo a vida”, comenta mãe de vítima da violência em evento na EMERJ


clique nas imagens para ampliar

O Fórum Permanente de Política e Justiça Criminal da EMERJ realizou, nesta sexta-feira, dia 22 de novembro, o evento “Necropolítica de Segurança Pública”, no auditório Desembargador Paulo Roberto Leite Ventura.

O encontro foi dividido em dois painéis. No primeiro, sobre “Política do Abate, Direito e Estado de Exceção”, estiveram presentes o presidente do Fórum, desembargador Paulo de Oliveira Lanzillotta Baldez; o vice-presidente do Fórum, desembargador Sérgio de Souza Verani; a professora Fernanda Maria da Costa Vieira; o cientista político e escritor Luiz Eduardo Soares; o promotor de Justiça do Estado do Rio de Janeiro Tiago Joffily; e o professor Antônio Martins.

A abertura do evento foi feita pelo desembargador Paulo Baldez. O magistrado comentou sobre a importância do assunto e falou sobre o objetivo do Fórum com a realização do evento.

“É um tema que se faz necessário, pois é uma discussão cada vez mais intensa diante da realidade que estamos vivendo. O objetivo do Fórum é trazer essa discussão sobre a política que estamos vivenciando, que está trazendo uma preocupação e perplexidade muito acentuada. Estamos vivendo situações que pensávamos que nunca mais iria acontecer. Precisamos trazer esse assunto para a academia, para o Judiciário, pois é necessário repercutir isso de algum modo, visando atender e combater essas situações que estão acontecendo na nossa cidade, no nosso Estado”, explicou.

“Há uma degradação da vida. Parece que ela não precisa mais existir, podendo ser eliminada. Vemos isso diariamente. Tem um caso recente, de uma moradora de rua que foi assassinada em Niterói quando pedia dinheiro. Isso é um exemplo estarrecedor. A sensação é de que as pessoas não são mais tratadas como humanos, e sim lixos”, desabafou o desembargador Sérgio Verani.

O promotor de Justiça Tiago Joffile fez uma análise jurídica do instituto da legítima defesa para avaliar, segundo ele, a “juridicidade da política de abate implementada no Estado, que pretende ser expandida para todo o país por meio de mudanças legislativas propostas no pacote anticrime”.

“Temos que entender de qual maneira esse movimento se insere em um fenômeno de esgarçamento do Estado de Direito e de instituição de uma política de exceção definida como necropolítica”. E completou: “É importante trazermos não só esse tema, que é pesado, mas também a realidade para dentro do Poder Judiciário. Há a necessidade de entender que essa é uma questão que precisa de um filtro do Direito, se quisermos continuar acreditando que ainda vivemos em um Estado de Direito”, disse.

O segundo painel foi sobre “Racismo Estrutural, Criminalização e Segurança Pública”. Nele, estiveram presentes a defensora pública do Estado do Rio de Janeiro Patrícia Fonseca Carlos Magno de Oliveira; a advogada Caroline Bispo; a pesquisadora da Justiça Global Monique Cruz; o coronel RR Íbis Pereira; a coordenadora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania, Julita Tannuri Lemgruber; e Bruna Silva e Ana Paula Oliveira, mães dos jovens Marcos Vinícius da Silva e Johnatha de Oliveira Lima, respectivamente, vítimas da violência no Estado.

O coronel Íbis Pereira relacionou o assunto ao modelo econômico que, segundo o próprio, “desconsidera vidas”. Também destacou a importância de discutir sobre o assunto.

“É um tema fundamental para o Estado Democrático de Direito e para a democracia. No meu modo de entender, estamos vivendo um momento de ataque, não só no Brasil, mas no mundo. A necropolítica vem como uma resposta ao modelo de economia, ao problema em um cenário de avanço do ultraliberalismo, onde não há lugar para o pobre. Não há o que fazer com milhões de excluídos. O que fazer com essas pessoas? A necropolítica responde: morte.

A morte é convocada para dar uma solução. É uma discussão importante e bastante atual. O debate envolve a sobrevivência do gênero humano, pois não é possível continuar com um modelo econômico que desconsidera vidas e a capacidade do planeta de sustentar esse desenvolvimento. Se não enfrentarmos isso, a espécie vai acabar. A espécie humana pode acabar. É uma discussão urgente, não apenas para nós brasileiros e sul-americanos, mas para todos os seres humanos. É um assunto grave”, alertou.

Em um discurso carregado de emoções, Bruna Silva lembrou do filho, explicou sobre o trabalho que realiza na Maré e falou sobre o desejo não só dela, mas dos moradores de comunidades.

“Meu filho foi morto carregando material escolar e vestindo uniforme da escola. Ele estava indo estudar. Muitos acham que os ‘favelados, pobres e negros’ de comunidade são contra o Estado. Não, não somos. Nossa oposição é sobre o tratamento que recebemos do Estado. Não tenho drogas na minha casa, também não tenho armas de fogo, além de não ter passagens pela polícia, mas paguei o preço por uma guerra que não foi causada por nós. Hoje, quando trabalho na Rede da Maré fazendo a campanha da ‘porta a porta’, fico bem. Eu tento pregar para os moradores sobre quais são os nossos direitos. Tento explicar sobre o que podem ou não fazer conosco. Precisamos fazer valer os nossos direitos.

Nossos filhos estão perdendo a vida. Queremos uma segurança pública que garantisse nosso bem-estar, assim como que o Estado trabalhasse com êxito e sucesso, salvando vidas e protegendo as pessoas dali”.

O evento marcou a 7ª reunião do Fórum Permanente de Política e Justiça Criminal.


22 de novembro de 2019