Relatório NUPELEIMS
7 Relat. Pesq. NUPELEIMS, Rio de Janeiro, n. 1, 2022. INTRODUÇÃO No ordenamento jurídico brasileiro, há uma série de tipos penais que condenam determinados discursos (artigos 138, 139, 140, 286, 287 e 331 do Código Penal), o que eventualmente os coloca em po- tencial conflito com a liberdade de expressão. Esse conflito potencial não é muito explorado (a depender do tipo penal, sequer abordado) pela doutrina penalista. Grosso modo , a dogmática penal apoia-se na ideia de que os crimes contra a honra ocorreriam quando identifica- dos determinados elementos, dentre os quais a intenção (o animus ) do agente. Assim, por exemplo, uma ofensa à honra subjetiva de uma pessoa seria considerada crime de injúria se (e apenas se) identificada a intenção de injuriar ( animus injuriandi ) do autor do fato. Por outro lado, se for identificado que a ofensa – a mesma ofensa – foi proferida num contexto de crítica e que a intenção do autor era criticar ( animus criticandi ) o ofendido, não haveria crime. Esse cenário relativamente simples esbarra, contudo, numa sé- rie de dificuldades práticas, embora nem todas relacionadas ao direito fundamental à liberdade de expressão. Não se trata de uma inconstitu- cionalidade dos tipos penais por violação à liberdade de expressão, ou seja, não se afirma aqui que haja uma incompatibilidade necessária en- tre os crimes contra a honra e a liberdade de expressão. Basta recordar que diversos países que adotam o regime democrático também pos- suem leis penais de calúnia, difamação e injúria, o que não significa, por outro lado, que esses tipos penais não estejam sujeitos a críticas e dificuldades na sua aplicação. No âmbito da OEA, por exemplo, foram justamente os problemas em relação a esses tipos penais que impul- sionaram uma forte revisão (ou mesmo revogação) das leis de calúnia, difamação ou injúria em países como México, Uruguai, Argentina, Cos- ta Rica, El Salvador e Jamaica (Nhuch, 2015, p. 59). Os enunciados normativos dos crimes contra a honra são vagos e abrangentes, com risco de atingirem situações que não deveriam. Entre fatos que são facilmente identificados como crime contra a honra e aqueles que não o são, há uma enorme zona cinzenta em que o apli- cador da lei deverá identificar a intenção do agente. E se é correto, tal
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