Relatório NUPEDICOM

35 Relat. Pesq. NUPEDICOM, Rio de Janeiro, n. 1, 2022. ções comerciais, já que o valor do aluguel permaneceu o mesmo antes e durante a pandemia. Com efeito, o excessivo dispêndio por parte do locatário só pôde ser constatado, quando muito, nos casos em que o contrato de locação era atualizado pelo IGP-M ou pelo IGP-DI. Esses casos, a rigor, melhor se enquadram no art. 317 CC, já que, em razão da pandemia, o valor do aluguel sofreu alta desproporcional em decorrência, sobretudo, do aumento das commodities , elevando o valor dos alugueres acima da média praticada no mercado de locação. 14 Nesse contexto, é interessante notar que o art. 7° da Lei n° 14.010/2020 , que instituiu o Regime Jurídico Emergencial Transitó- rio durante a pandemia de Covid-19, tentou, em postura conser- vadora, impedir a revisão contratual nas hipóteses de aumento da inflação, variação cambial, desvalorização ou substituição do padrão monetário, efeitos econômicos da crise de saúde pública tidos pelo legislador nacional — na contramão do resto do mundo 15 — como “previsíveis” 16 . A postura ortodoxa do legislador emergencial não impediu, porém, o Poder Judiciário fluminense de readaptar os contratos . É bem verdade que o § 1º do art. 7º da Lei do RJET afastava expressa- 14 Ambos os índices são medidores mensais abrangentes da variação de preços de diversas atividades econô- micas e distintas etapas do processo produtivo, tratando-se de indicadores do nível de atividade econômica do Brasil como um todo. Sua variação, portanto, não possui relação direta com o mercado de locações, mas sim com a aceleração — ou não — da atividade econômica do país. Seu cálculo é realizado a partir da média da inflação em três grandes setores da economia: (i) o agronegócio e a indústria da transformação (60% Índice de Preços ao Produtor Amplo - IPA); (ii) as despesas das famílias (30% Índice de Preços ao Consumidor - IPC); e (iii) as despesas com materiais e serviços da construção (10% Índice Nacional de Custo da Construção - INCC). Sua inadequação para a atualização monetária de contratos de locação levou à própria FGV a criar, em dezem- bro de 2021, um índice específico para o mercado de locações: o Índice de Variação de Aluguéis Residenciais – IVAR ( <https://portalibre.fgv.br/indice-de-variacao-de-alugueis-residenciais >). 15 Diversas leis e decretos legislativos surgiram ao redor do mundo reconhecendo o caráter extraordinário da pandemia e adotando medidas para minimizar os impactos da covid-19 em diversas áreas. À guisa de exemplo, cite-se a Lei 4-C/2020, de 06.04.2020, e a Lei 17/2020, de 29.05.2020, que, respectivamente, institui – e, na sequ- ência, altera – em Portugal o regime excepcional para as situações de mora no pagamento da renda devida em contratos de arrendamento urbano habitacional e não habitacional no âmbito da pandemia de covid-19. Até na Inglaterra, país sem tradição legislativa, foi editado o Coronavirus Act 2020 , em 25.03.2020, e na Argentina, foi promulgado o Decreto 320/2020, em 29.03.2020, que, dentre outras medidas, proibia o despejo até 30.09.2020, bem como prorrogava, até a mencionada data, a vigência dos contratos de locação imobiliária e congelava o valor dos alugueres desses contratos (arts. 2º, 3º e 4º). 16 Lei nº 14.010, de 10 de junho de 2020. “Art. 7º. Não se consideram fatos imprevisíveis, para os fins exclusivos dos arts. 317, 478, 479 e 480 do Código Civil, o aumento da inflação, a variação cambial, a desvalorização ou a substituição do padrão monetário.”

RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz